sexta-feira, 4 de novembro de 2022

 



Era uma vez um menino que era apaixonado pelas palavras. Certo dia ele começou a escrever a história do mundo. Era arriscado, mas mesmo assim ousou saber o que não podia: aonde o sol dormia depois do dia? Quantas nuvens cabiam no céu? Que cor tinha o ontem? Quantas folhas caem numa floresta tropical ao fim do outono? Por que os pássaros não caem do céu quando morrem? Por que o oceano no hemisfério sul não transborda para o espaço? Como o azul podia ser mais melancólico do que uma lembrança apagada? 

Por que uma baleia tinha chafariz se não era uma praça? 

E foram tantas perguntas e tantos porquês escritos em fina caligrafia, que o menino, homem se tornou e o que eram algumas páginas, se tornou uma pilha infindável de livros. Era sua Babel. Agora tinha certeza. Quanto mais escrevia, mais próximo do céu ele ficava. Já podia esticar o braço e alcançar os anéis de Saturno. 

Da última vez que soube dele, foi por um incidente intergaláctico. 

As palavras eram inventadas numa novilíngua.

Os livros já não tinham mais numeração. Não havia início, mas inícios. E, claro, fim era uma palavra indizível. 


Carlos Eduardo Leal