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sábado, 22 de junho de 2024

Preocupação

Christian Schloe 

bilhete não respondido: que ameaças são essas?

Ana Cristina César

quarta-feira, 22 de novembro de 2023

 


I.

Enquanto leio meus seios estão a descoberto. É difícil concentrar-me ao ver os bicos. Então rabisco as folhas deste álbum. Poética quebrada pelo meio.

II.

Enquanto leio meus textos se fazem descobertos. É difícil escondê-los no meio dessas letras. Então me nutro das tetas dos poetas pensados no meu seio.

Ana Cristina César

domingo, 30 de janeiro de 2022

 



Tu queres sono: despe-te dos ruídos, e

dos restos do dia, tira da tua boca

o punhal e o trânsito, sombras de

teus gritos, e roupas, choros, cordas e

também as faces que assomam sobre a

tua sonora forma de dar, e os outros corpos

que se deitam e se pisam, e as moscas

que sobrevoam o cadáver do teu pai, e a dor (não ouças)

que se prepara para carpir tua vigília, e os cantos que

esqueceram teus braços e tantos movimentos

que perdem teus silêncios, o os ventos altos

que não dormem, que te olham da janela

e em tua porta penetram como loucos

pois nada te abandona nem tu ao sono..


Ana Cristina César

terça-feira, 24 de junho de 2014

Toda mulher


Cayetano De Arguer Buigas

a coisa que mais o preocupava
naquele momento
era estudo de mulher

toda mulher
dos quinze aos dezoito

Não sou mais mulher.
Ela quer o sujeito
Coleciona histórias de amor.


 Ana Cristina César
In  A Teus Pés, 1982

terça-feira, 1 de abril de 2014

Definição

OLGA VERCHOLAMOSA


poeta é onda
onda é canto
canto é espera
espera é adeus
adeus é morte
morte é nódoa
nódoa é ostra
ostra é ensaio
ensaio é busca
busca é poeira
poeira é poeta


Ana Cristina Cesar, "Poética" 

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Cabeceira

Daryl Zang


Intratável.
Não quero mais pôr poemas no papel
nem dar a conhecer minha ternura.
Faço ar de dura,
muito sóbria e dura,
não pergunto
"da sombra daquele beijo
que farei?"
É inútil
ficar à escuta
ou manobrar a lupa
da adivinhação.
Dito isto
o livro de cabeceira cai no chão.
Tua mão que desliza
distraidamente?
sobre a minha mão


 Ana Cristina César

sábado, 28 de dezembro de 2013

Quartetos



Desdenho os teus passos
Retórica triste:
Sorrio na alma
De ti nada existe

Eu morro e remorro
Na vida que passa
Eu ouço teus passos
Compasso infernal

Nasci para a vida
De morte vivi
mas tudo se acasa
silêncio. Morri


Ana Cristina César, In Inéditos e dispersos

sábado, 10 de agosto de 2013

Quartetos



Desdenho os teus passos
Retórica triste:
Sorrio e na alma
De ti nada existe

Eu morro e remorro
Na vida que passa
Eu ouço teus passos
Compasso infernal

Nasci para a vida
De morte vivi
Mas tudo se acaba
Silencio. Morri


Ana Cristina César

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Samba-Canção

Ennio Montariello


Tantos poemas que perdi. 
Tantos que ouvi, de graça, 
pelo telefone – taí,
eu fiz tudo pra você gostar, 
fui mulher vulgar, 
meia-bruxa, meia-fera, 
risinho modernista 
arranhando na garganta, 
malandra, 
vândala, 
talvez maquiavélica, 
e um dia emburrei-me, 
vali-me de mesuras 
era uma estratégia
(fiz comércio, avara, 
embora um pouco burra, 
porque inteligente me punha 
logo rubra, ou ao contrário, cara 
pálida que desconhece 
o próprio cor-de-rosa, 
e tantas fiz, talvez 
querendo a glória, a outra 
cena à luz de spots, 
talvez apenas teu carinho, 
mas tantas, tantas fiz...

Ana Cristina César

sexta-feira, 3 de maio de 2013

Litoral




meu amor escapa outra vez pela
fenda calada do verso a voz
fraca sobre a curva naufraga
ondas mornas imóveis
meu amor escapa esta superfície
irrespirável enreda
o voo o movimento
inverso não mais teus ossos
águas sem sopro onde uma
temporada apenas
neste inferno


Ana Cristina César

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Como rasurar a paisagem

Ennio Montariello


a fotografia é um tempo morto
fictício retorno à simetria
secreto desejo do poema
censura impossível
do poeta


Ana Cristina César

quinta-feira, 5 de abril de 2012

daniel gieseke


Nada disfarça o apuro do amor.
Um carro em ré. Memória da água em movimento. Beijo.
Gosto particular da tua boca. Último trem subindo ao céu.
Aguço o ouvido.
Os aparelhos que só fazem som ocupam o lugar clandestino da felicidade.
Preciso me atar ao velame com as próprias mãos.
Sirgar.
Daqui ao fundo do horto florestal ouço coisas que nunca ouvi,
pássaros que gemem.


Ana Cristina César

quarta-feira, 28 de março de 2012




Quando entre nós
só havia uma carta certa
a correspondência completa
o trem os trilhos
a janela aberta uma certa paisagem
sem pedras ou sobressaltos
meu salto alto
em equilíbrio
o copo d’água
a espera do café


ana cristina césar

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

imagino como seria te amar

 

Secretary - Igor Shulman


imagino como seria te amar

teria o gosto estranho das palavras

que brincamos

e a seriedade de quando esquecemos

quais palavras

imagino como seria te amar

desisto da ideia numa verbal volúpia

e recomeço a escrever

poemas.


Ana Cristina Cesar, Poética

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Minha boca também
está seca
deste ar seco do planalto
bebemos litros d'água
Brasília está tombada
iluminada
como o mundo real
pouso a mão no teu peito
mapa de navegação
desta varanda
hoje sou eu que
estou te livrando
da verdade.



É muito claro
amor
bateu
para ficar
nesta varanda descoberta
a anoitecer sobre a cidade
em construção
sobre a pequena constrição
no teu peito
angústia de felicidade
luzes de automóveis
riscando o tempo
canteiros de obras
em repouso
recuo súbito da trama.

Ana Cristina César

quinta-feira, 21 de julho de 2011


Nasci para a vida
De morte vivi
Mas tudo se acaba
Silêncio. Morri.

 Ana Cristina César

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Protuberância


Este sorriso que muitos chamam de boca
É antes um chafariz, uma coisa louca
Sou amativa antes de tudo
Embora o mundo me condene
Devo falar em nariz (as pontas rimam por dentro)
Se nos determos amanhã
Pelo menos não haverá necessidades frugais nos espreitando
Quem me emprestar seu peito na madrugada
E me consolar, talvez tal vez me ensine um assobio
Não sei se me querem, escondo-me sem impasses
E repitamos a amadora sou
Armadora decerto atrás das portas
Não abro para ninguém, e se a pena é lépida, nada me detém
É sem dúvida inútil o chuvisco de meus olhos
O círculo se abre em circunferências concêntricas que se
Fecham sobre si mesmas
No ano 2001 terei (2001-1952=) 49 anos e serei uma rainha
Rainha de quem, quê, não importa
E se eu morrer antes disso
Não verei a lua mais de perto
Talvez me irrite pisar no impisável
E a morte deve ser muito mais gostosa
Recheada com marchemélou
Uma lâmpada queimada me contempla
Eu dentro do templo chuto o tempo
Um palavra me delineia
VORAZ
E em breve a sombra se dilui,
Se perde o anjo.


Ana Cristina César

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Esvoaça



É como a vela que se apaga,
e a fumaça sobe e se atenua.
É o amor fraco que se apaga,
não adiantam poemas p'ra lua.
Sofre o homem, o amor acaba,
e a doce influência esvoaça,
como o fio adelgaçado
de fina e translúcida fumaça.

Esvoaça, esvoaça,
atenua o amor,
atenua a fumaça.

Pra que tanta dor,
se o amor que vai sumindo
adelgaça,
esvoaça, esvoaça, esvoaça...


Ana Cristina César
Edward Poynter

jardins inabitados pensamentos
pretensas palavras em
pedaços
jardins ausenta-se
a lua figura de
uma falta contemplada
jardins extremos dessa ausência
de jardins anteriores que
recuam
ausência freqüentada sem mistério
céu que recua
sem pergunta


Ana Cristina César

terça-feira, 31 de maio de 2011

Fama e fortuna


Assinei meu nome tantas vezes
e agora viro manchete de jornal.
Corpo dói - linha nevrálgica via
coração. Os vizinhos abaixo
imploram minha expulsão imediata.
Não ouviram o frenesi pianíssimo da chuva
nem a primeira história mesmo de terror:
no Madame Tussaud o assassino esculpia
as vítimas em cera. Virou manchete.
Eu guio um carro. Olho a baía ao longe,
na bruma de neon, e penso em Haia,
Hamburgo, Dover, âncoras levantadas
em Lisboa. Não cheguei ao mundo novo.
Nada é nacional. Desço no meu salto,
dói a culpa intrusa: ter roubado
teu direito de sofrer. Roubei tua
surdina, me joguei ao mar,
estou fazendo água. Dá o bote.


Ana Cristina César