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segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Força

Edmund Blair Leighton


Desmancha o nó,
tira a ferrugem.
espana o pó.
Empurra o pesado,
cola o quebrado,
cerze o rompido,
coça a coceira,
gruda o trincado,
pensa o ardido
e faz brincadeira do verso chorado,
que a vida é rendeira
de sedas ou trapos,
de rendas, farrapos
ou fios de algodão;
que a fibra é comprida e o mundo, artesão.


Flora Figueiredo

domingo, 1 de novembro de 2015

Fronteira

Konstantin Razumov 


Sou capaz de fazer florescer
quantas flores você desejar
e lhe dar uma a toda hora,
a cada dia,
o ano inteiro.
A reflora é permanente,
desde que você não tente avançar.
Evite pisar no meu canteiro.


Flora Figueiredo 
em Amor a céu aberto

segunda-feira, 9 de junho de 2014

Flutuações


O sonho aprendeu a pairar bem alto,
lá onde o sobressalto nem sequer nasceu,
Namorou a trôpega ilusão,
até que, trêfego e desajeitado,
desprendeu-se de seu reino idealizado,
veio pousar tamborilante em minha mão.
Assim, aquecido e aconchegado,
parece que se esqueceu de ir embora.
Na hora em que ressona distraído,
eu lhe pingo malemolências ao ouvido,
à sua inquietação eu me sujeito.
Eis que o sonho dorme agora aqui comigo,
seu corpo repousando no meu peito.


Flora Figueiredo
In Amor a céu aberto, 1992

quarta-feira, 23 de abril de 2014

O verão

 Francesca Strino.


Chego úmido e túrgido,
os poros ansiosos.
Alterno o indecoroso e a lassidão.
Tropical que sou,
venho alinhavado em sedução,
no tom abrasivo do pecado.
Por onde eu vou,
risco perfis de sombras
que são do sol a cicatriz.
Ao meio-dia, elas soltam-se fartas
e amam-se quietas e sobrepostas,
deitando as sinuosas sobre as retas.
O calor, sem pudor, lhes roça as costas.


Flora Figueiredo

quarta-feira, 2 de abril de 2014



A neblina pisa leve e macia,
rendilhada e feminina.
Mantilha, silêncio, sapatilha.
Desce na sombra,
volita, dança e vai embora.
Névoa, bruma, fumaça, mulher.
Insinua, sugere e depois passa.
Vaga esperança em coração de malmequer


Flora Figueiredo 

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Nydia Lozano 


Faça o seguinte:
Assopre o pensamento triste,
deixe escorrer a última lágrima,
conte até vinte.
Abra então a janela,
aquela que dá para o voo dos pardais,
procure a luz que pisca lá na frente
(evite as sombras que ficaram lá para trás).
Ao encontrá-la,
coloque-a dentro do peito
de tal jeito, que possa ser notada
do lado de fora.
Acrescente agora uma pitada de poesia,
do tipo que passa por nós todos os dias
e nem sequer consegue ser notada.
Aumente o brilho
com toda a intensidade
de que um sorriso é capaz.
A felicidade é o seu limite,
e o paraíso é você mesmo(a) quem faz.

Flora Figueiredo

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Poema quieto



Deixe que o silêncio discorra por nós
e ache as respostas.
Que nos beije o peito,
que nos coce as costas
e nos dê o direito de calar o tempo.
Deixe que ele cubra o momento
e se distenda leve
como um lençol de renda;
que seja arguto o bastante
para impedir o instante de ser breve,
Deixe que o silêncio nos proteja.
Pra que ninguém escute,
nada se revele
e possamos trocar as nossas peles
sem que a censura veja.


Flora Figueiredo
In Calçada de Verão, 1989

terça-feira, 16 de julho de 2013

Melódico



Canto aos quatro cantos,
aos quatro ventos.
Desnudo as pautas do tempo
em claves, bemóis e sustenidos.
Hei de fazer chegar aos seus ouvidos
uma rima de amor em tom maior.
Quando o mundo cantá-la já de cor,
eu trago a flauta
que põe ternura nessa nota que ainda falta
pra perpetuar o nosso amor na partitura.


Flora Figueiredo, In Chão de Vento

domingo, 14 de abril de 2013



Trouxe para você 
um kit ternura. 
Vem composto 
de um beijo molhado e aquecido 
no ponto ideal. 
Para não causar resfriado 
nem queimadura de terceiro grau. 
Uma mordiscada 
para ser usada por perto da nuca, 
de preferência sempre perfumada; 
um susurro na orelha, 
no lado de trás, 
onde o arrepio se satisfaz; 
um abraço tão justo, tão justo, 
que o coração pode levar um susto 
com medo de ser atropelado; 
um carinho tão preciso 
que lhe faça desvestir o juízo, 
e de tal habilidade, 
que, a cada recaída minha 
de infidelidade, 
possa servir como abono. 
Um aviso 
para ser colado à testa 
e em toda fresta que você tiver: 
"Tem dono." 


Flora Figueiredo
Kit - Do livro Amor a Céu Aberto - Rio de Janeiro - Nova Fronteira, 1992  

segunda-feira, 15 de outubro de 2012



Vou buscar a poesia onde ela estiver, 
Fazê-la deitar subjugada, 
tênue, 
passiva, 
mansa, 
mulher. 
Quero-a solta e lassiva, 
aberta e deflorada, 
para fazer dela o que eu quiser. 
Hei de dominá-la totalmente, 
levá-la a gozar até a embriaguez. 
Feita minha serva e dependente, 
vou ofertá-la ao seu deleite. 
Por favor, aceite. 
Quero que ela o faça chorar outra vez. 


Flora Figueiredo

domingo, 26 de agosto de 2012

Administrando

Ils Vilnis



Não quero escrever um livro 
a respeito 
de cada amor imperfeito 
que me aconteceu; 
não quero musicar 
toda vez que uma alegria se perdeu; 
não quero decorar a parede 
com desencanto ou nostalgia. 
Prefiro admitir a flor 
e a pétala que possa cair 
para magoar o meu cenário. 
Sei que todo peito é permeado de contrários, 
que em todo jogo pode haver uma derrota. 
Rabisco apenas a minha nota de rodapé: 
"Não é só de vitórias que se escreve 
uma verdadeira história de mulher." 


Flora Figueiredo

terça-feira, 26 de abril de 2011

Companheirismo

by Sally Rosenbaum

O poeta
não fica só,
pois tem sempre ligação direta
com a alegria.
Se a estrela brilha,
ele se ilumina
e se corre a chuva
fina e fria,
ele logo entra em sintonia
e gosta.
Se a lua já subiu
pelo barranco,
o poeta se desnuda
e beija o branco.
Tem sempre uma resposta
ao chamado do sol,
seu eterno namorado,
que deita irreverente
em seu jardim.
O poeta é assim:
um eterno acompanhado.
Mas, se um dia
ele ficar calado,
espera.
Não é que esteja sozinho:
deve estar aos pés de um passarinho
compondo o amanhecer da Primavera.


Flora Figueiredo

domingo, 17 de abril de 2011

Mary Jane ansell

Encontrei um verso fraturado,
caído na esquina da rua do lado,
Tinha se perdido de um coração saudoso
que passava por ali, desiludido.
Coloquei-o de pé,
emendei seus pedaços,
refiz suas linhas,
retoquei seus traços.
Afaguei suas dores como se fossem minhas.
Agora, novamente estruturado,
espero que ele não olhe para trás
e não misture sonhos
com amargas falências do passado;
que saiba enfeitar a estrela lá na frente
com fartos laços de rima colorida.
... pois é para o futuro que caminham
todos os passos apressados desta vida.


Flora Figueredo

sábado, 5 de março de 2011

by  Isabel Gomes da Silva

Eu te pressinto correndo ao meu lado
e te admiro.
Gosto de teu sorriso sem conflito,
tua trança
que balança frouxa contra o vento.
Acostumei-me a te levar comigo
pelos meus sucessos
e nos contratempos.
Eu me desculpo pelos meus excessos.
Há espaço pra nós duas,
suficiente
para poder te manter irreverente,
apoiada na minha metade equilibrada.
Assim me encosto
na textura sem rugas de teu rosto.
Se houver um quase nada
de divergência,
é melhor prevalecer a tua inconseqüência,
que é o nosso lado mais sadio.
Se por acaso houver um desafio,
há de vencer-me a ingenuidade
que evaporou no tempo,
que descorou nos tons da meia-idade.
Mas, quando um dia confrontarmos
nossas diferenças,
quero que se sobreponha
por sobre minha face mais tristonha
a tua liberdade mais traquina.
Eu te dou a mão num gesto de ternura,
porque te quero sábia,
porque me quero pura.
Meio mulher madura,
meio menina.


Flora Figueiredo

quinta-feira, 23 de setembro de 2010


Mais uma vez o tempo me assusta.
Passa afobado pelo meu dia,
Atropela minha hora,
Despreza minha agenda.
Corre prepotente,
A disputar lugar com a ventania.
O tempo envelhece, não se emenda.

Deveria haver algum decreto
Que obrigasse o tempo a desacelerar
E a respeitar meu projeto.
Só assim, eu daria conta
Dos livros que vão se empilhando,
Das melodias que estão me aguardando,
Das saudades que venho sentindo,
Das verdades que ando mentindo,
Das promessas que venho esquecendo,
Dos impulsos que sigo contendo,
Dos prazeres que chegam partindo,
Dos receios que partem voltando.

Agora, que redijo a página final,
Percebo o tanto de caminho percorrido
Ao impulso da hora que vai me acelerando.
Apesar do tempo, e sua pressa desleal,
Agradeço a Deus por ter vivido,
Amanhecer e continuar teimando ... 

Flora Figueiredo

domingo, 11 de julho de 2010

Teorema



Alguma coisa saiu errada
na minha Matemática.
Não sei se foi excesso de poesia,
dose demais de fantasia,
ou simplesmente falta de prática.
Tenho certeza que somei,
multipliquei pra dividir
em partes justamente desiguais.
Subtraí só de mim,
para que pudesse lhe caber um tanto a mais.
Quando chego ao final da operação,
não consigo decifrar o que ocorreu.
A soma partiu, saiu devedora.
O resultado: noves fora, eu.


Flora Figueiredo

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Regulamento


Eu não juro nada
Por coisa alguma,
pois que todo caminho é incerteza.
A ordem se desarruma,
a história se desajeita,
o arranjo troca de lado e vira a mesa.
Tampouco prometo.
Nesse jogo de regras e tratos,
rolam os dados,
mudam os fatos,
num ciclone célere, inclemente.
Só o que posso é me entregar completamente
a toda causa que me dedicar,
a cada tempo que eu puder viver,
a cada amor que me fizer amar.

Flora Figueiredo

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Ficamos assim





Ficamos assim: você joga as queixas no telhado,
eu ponho as manias de lado,
você lava a escadaria, eu rego o jardim.
Podemos varrer juntos as nódoas secas aderentes ao passado.
Se você se habilita, eu me disponho, num desafio à desdita.
Você acende a luz, eu desempeno o sonho,
enquanto você ensaia o passo, eu troco a fita.
Na mesa torta, a toalha colorida.
O resto é fácil: basta mandar flores ao futuro,
derrubar o muro e acreditar na vida.


Flora Figueiredo

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Coisas de verão...


O sol desceu pelo escorregador e fez o mundo sorrir tão de repente,
que toda a gente parou para assistir.
Coisas de Verão ...
É o coração que fica adolescente, o corpo forte, de pé para aplaudir.



Flora Figueiredo

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Indomável

 Duarte Vitoria

Sem água morna, 
sem pedra mole, 
nem fogo brando. 
Amor quando chega, 
tem que vir arrebatando, 
virando a mesa, 
rompendo a porta. 
Amor que se preza 
agarra a vida na marra 
e desentorta; 
abraça a hora com força 
e desamassa. 
Vem certo de ficar, vai indo embora; 
vem pensando em partir, mas vai ficando. 
Sempre confundindo, é certo-errando 
que deixa tudo fora do lugar. 
… e quanto mais o peito resistir, 
o tanto mais vai explodir de muito amar.


Flora Figueiredo