A meio da noite pediu-me que a levasse a casa. Fazia muito frio. Não sei o que se passava. Tudo tão rápido. Uma história de amor é um instante. Amor? Há pouco tempo. Ela já estava vestida e eu ainda estava dentro da cama. Disse-lhe que não tinha carro, que o tinha emprestado. Ficou furiosa. Eu disse que chamava um táxi. Ela disse que não valia a pena.
Continuei a olhar para o branco das paredes. Tinha-a conhecido dias antes. Tinha conseguido fazê-la corar. Nunca pensei que ela me quisesse e quis-me. Ela também não devia saber quase nada.
Podia ter-lhe dito: "Não vás, fica". Talvez ficasse. Talvez precisasse que eu lhe pedisse para ficar. Talvez tivesse medo. Não disse nada. Talvez fosse o bastante agarrá-la por um braço. Talvez tivesse medo.
Podia ter-me dito: "Obrigada por estes dias. Julguei-me feliz. A ilusão é muito importante". Não disse nada, estava furiosa. Se calhar por eu continuar deitado, nada fazer para a impedir de partir, nem uma palavra, nada. Fazia muito frio. Era a meio da noite. Não havia razão para partir.
Já disse: ela saiu furiosa. Eu continuei deitado. Nada mais dissemos que valha a pena repetir. O amor é que é cada vez mais rápido. Sente-se só a passar. Não tem tempo para ficar. Ninguém sabe o que está a acontecer, nem se tem importância ou não tem importância ninguém saber o que está a acontecer. Disto tenho a certeza. Voltarei a adormecer e a acordar. Os dias passarão. Ela não voltará. Eu não voltarei. Não vale a pena continuar. Tenho poucas forças. Nunca esteve tanto frio assim de repente.
Pedro Paixão