terça-feira, 19 de abril de 2022

“A fama é reles...”



Ter fama é reles; a escalada

ao apogeu segue outras leis.

Arquivos não servem de nada,

Não tremas sobre os teus papéis.


Criar é se entregar de todo,

e não sucesso ou alarido.

É vergonhoso, sendo engodo,

virar provérbio difundido.


Cumpre viver, mas sem disfarce,

para atrair-se enfim o puro

amor do espaço ou escutar-se

o apelo, ao longe, do futuro.


Deixa as lacunas no destino,

nas obras, não. Qualquer passagem,

qualquer capítulo ou domínio

de tua vida – anota à margem.


Some no anonimato e esconde

teus passos como sítio oculto

por brumas muito espessas onde

não há como entrever seu vulto.


Outros, que irão por tua rota,

seguem teu rastro, passo a passo.

Mas não te cabe ser quem opta

entre um sucesso ou um fracasso.


Não rendas nunca, por motivo

algum, teu rosto, tua estrada;

prossegue vivo, apenas vivo

até o fim, vivo e mais nada.


 BÓRIS PASTERNAK, 1956