domingo, 15 de agosto de 2021

A adormecida

 

Mariska Karto


Que segredo incandesces no peito, minha amiga,

Alma por doce máscara aspirando a flor?

De que alimentos vãos teu cândido calor

Gera essa irradiação: mulher adormecida?


Sopro, sonhos, silêncio, invencível quebranto,

Tu triunfas, ó paz mais potente que um pranto,

Quando de um pleno sono a onda grave e estendida

Conspira sobre o seio de tal inimiga


Dorme, dourada soma: sombras e abandono.

De tais dons cumulou-se esse temível sono,

Corça languidamente longa além do laço,


Que embora a alma ausente, em luta nos desertos,

Tua forma ao ventre puro, que veste um fluido braço,

Vela, Tua forma vela, e meus olhos: abertos.


Paul Valéry

Tradução: Augusto de Campos