Death be not pround, though some have called thee
Mighty and dreadfull, for, thou art no soe,
for those, whom thou think'st thou dost overthrow,
Die not, poore death, nor yet canst thou kill me.
John Donne
I
Chaga de sol, rosácea ardente
Aqueles linhos de sangue, o peito
Mais profundo, aberto, extenso,
Toda a delicadez do poeta
Flui
Exangue
Num círculo de dor. Assim te lembro.
II
Dorme o pastor. E sobre ele a pedra.
E dentro dele,
no coração, no ventre
A primeira
libélula. Dorme
Recente de raízes, o poeta.
VII
Pastor, as violetas estão sobre os pilares
É tempo do poeta abrir seu canto
Tempo de iniciação, tempo de esfera
E de uma linha-mundo curvo-reta:
Trajetória de amor e de amplidão.
Hilda Hilst
do livro Exercícios, p. 17 - 19
imagens: Viktor Sheleg
III
No seu corpo de terra, dorme o inocente.
Cantou a solidão, a salamandra
E um cavalo e um cavaleiro de barro
Carmesim. E teve amor ao medo e à centelha
Que o fez cantar assim.
IV
Dorme o profeta. E se não escuta o vento
Ouve na minha boca o seu Ofício de treva.
Em aflição, em amor eu te celebro
E na tua mão fechada está o meu grito:
O que esperaste da minha boca
V
Dorme o cantor: No dia de vossa ira
Lembrai-vos, Senhor, do sal e do carvão
Nas minas. E alguém há de calar os algozes
Do tempo, e há de nascer a flor sobre o teu sono
E pelo teu lamento.
VI
Dorme o amigo no seu corpo de terra.
E dentro dele a crisálida amanhece:
Ouro primeiro, larva, depois asa
Hás de romper a pedra, pastor e companheiro.
VII
Pastor, as violetas estão sobre os pilares
É tempo do poeta abrir seu canto
Tempo de iniciação, tempo de esfera
E de uma linha-mundo curvo-reta:
Trajetória de amor e de amplidão.
Hilda Hilst
do livro Exercícios, p. 17 - 19
imagens: Viktor Sheleg