sexta-feira, 4 de março de 2011

 ALEX ALEMANY

Que vaidade imaginar
que posso dar-te tudo, amor e fortuna,
itinerários, música, brinquedos.
É verdade que sim:
dou-te tudo que é meu, é verdade,
mas isso tudo que é meu não te basta
como a mim não me basta que me dês
tudo que é teu.

Por isso nunca seremos
o casal perfeito, o bilhete postal,
se não formos capazes de aceitar
que só na aritmética
o dois nasce de um mais um.

Um papelito por aí
diz simplesmente:
Foste sempre o meu espelho,
quer dizer, para me ver tinha que olhar-te.

E este fragmento:
A lenta máquina do desamor
a engrenagem do refluxo
os corpos que deixam as almofadas
os lençóis os beijos
e de pé frente ao espelho interrogando-se
cada um a si mesmo
já não olhando-se entre si
não já nus para o outro
não já te amo,
meu amor

Júlio Cortázar