sábado, 11 de setembro de 2010
Anaïs Nin, Henry & June
Conheci Henry Miller.
Ele veio almoçar com Richard Osborn, um advogado que eu tinha que consultar sobre o contrato para o meu livro D.F. Lawrence.
Quando ele saltou do carro e se dirigiu para a porta onde eu estava esperando, vi um homem de que gostei. Em seus escritos ele é extravagante, viril, animal, opulento. É um homem a quem a vida embriaga, pensei. É como eu.
No meio do almoço, quando estávamos discutindo livros seriamente, e Richard passara a um longo discurso, Henry começou a rir. Ele disse:
- Eu não estou rindo de você, Richard, mas simplesmente não consigo evitar. Não ligo a mínima, nem um pouco para quem está certo. Estou feliz demais. Estou feliz demais neste exato momento com todas as cores à minha volta, o vinho. O momento é tão maravilhoso, tão maravilhoso. - ele ria quase a ponto de chorar. Estava bêbado. Eu estava bêbada, também, por completo. Sentia-me aquecida, tonta e feliz.
Conversamos durante horas. Henry disse as coisas mais verdadeiras e profundas, e ele tem um jeito de dizer "mmmm" enquanto divaga por sua viagem introspectiva.
Antes de conhecer Henry eu estava concentrada em meu livro sobre D.H. Lawrence. Ele está sendo publicado por Edward Titus, e eu estou trabalhando com o assistente dele, Lawrence Drake.
- De onde você é? - pergunta em nosso primeiro encontro.
- Sou metade espanhola, metade francesa. Mas fui criada na América.
- Você simplesmente sobreviveu ao transplante. - ele parece estar zombando ao falar. Mas sei que não.
Ele passa a falar do trabalho com bastante entusiasmo e velocidade. Fico grata. ele me chama de romântica. Eu fico zangada.
- Estou cheia do meu próprio romantismo!
Ele tem uma cabeça interessante - olhos pretos vívidos, cabelo preto, pele morena, narinas e boca sensuais, um bom perfil. Parece um espanhol, mas é judeu - russo, diz ele. É uma pessoa que me intriga. Parece selvagem, facilmente irritável. Converso cautelosamente.
Quando me leva a seu apartamento para examinar as provas, diz que eu lhe interesso. Eu não vejo por quê. - ele parece ter tido muitas experiências; por que se preocupa com uma iniciante? Nós conversamos, na defensiva. Nós trabalhamos, não tão bem. Eu não confio nele. Quando me diz coisas agradáveis, acho que está zombando da minha inexperiência. Quando põe os braços à minha volta, acho que está se divertindo com uma mulherzinha superintensa e ridícula. Quando se torna mais intenso, desvio o rosto da nova experiência de seu bigode. Minhas mãos estão frias e úmidas. Eu digo a ele com franqueza:
- Você não devia flertar com uma mulher que não sabe flertar.
Isso o diverte, a minha seriedade. Ele diz:
- Talvez você seja o tipo de mulher que não magoa um homem. - Tinha sido humilhado. Quando achou que eu havia dito: "Você me aborrece", ele se afastou como se eu o tivesse mordido.Eu não digo esse tipo de coisa. Ele é muito impetuoso, muito forte, mas não me aborrece. Eu respondo a seu quarto ou quinto beijo. Começo a me sentir embriagada. Então me levanto e digo incoerentemente:
- Eu me vou agora... para mim não pode ser sem amor. - Ele me provoca. Morde minhas orelhas e me beija, e eu gosto de sua impetuosidade. Ele me atira no sofá por um momento, mas de certa maneira eu escapo. Estou consciente do desejo dele. Gosto de sua boca e da força de seus braços, mas o desejo dele me assusta, me repulsa. Acho que é porque eu não o amo. Ele me excitou mas eu não o amo, não o quero.
Assim que noto isso (o desejo dele, apontando para mim, é como uma espada entre nós), eu me liberto e saio, sem magoá-lo de modo algum.
Eu penso bem, só queria o prazer sem sentimento. Mas alguma coisa me detém. Há em mim algo intocado, inabalado, que me ordena. Isto terá que ser acionado se pretendo me agitar inteiramente. Penso nisso no metrô, e me perco.
Anaïs Nin, Henry & June