quarta-feira, 13 de setembro de 2023

 


"Senhor, dá-me a faculdade de jamais rezar, poupa-me a insanidade de tua adoração, afasta de mim essa tentação de amor que me entregaria para sempre a ti. Que o vazio se estenda entre o meu coração e o céu! Não desejo ver meus desertos povoados pela Tua presença, minhas noites tiranizadas por Tua luz, minhas Sibérias fundidas sob Teu sol. Mais solitário do que Tu, quero minhas mãos puras, ao contrário das Tuas que sujaram-se para sempre ao modelar a terra e ao misturar-se nos assuntos do mundo. Só peço à Tua estúpida onipotência respeito para minha solidão e meus tormentos. Não tenho nada a fazer com tuas palavras. Conceda-me o milagre recolhido antes do primeiro instante, a paz que Tu não pudestes tolerar e Te incitou a abrir uma brecha no nada para inaugurar esta feira dos tempos, e para condenar-me assim ao universo, à humilhação e à vergonha de existir. "

Emil Cioran, Breviário de Decomposição