O senhor definiu muito bem um fator incontestavelmente moral na natureza da música; a
saber, que ela mede o curso do tempo de uma forma especial e cheia de vida, e assim lhe
empresta vigilância, espírito e preciosidade. A música desperta o tempo; desperta a nós, para
tirarmos do tempo um gozo mais refinado; desperta... e portanto é moral. A arte é moral na
medida em que desperta. Mas que sucede quando ela faz o contrário? Quando entorpece,
adormenta, estorva a atividade e o progresso? Também disso a música é capaz; sabe
perfeitamente agir como ópio. Uma influência diabólica, meus senhores! O ópio é uma obra do
Diabo, porque causa apatia, estagnação, passividade, inatividade servil... Há na música um
elemento perigoso, senhores. Insisto no fato da sua natureza ambígua. Não exagero ao declarar
que ela é politicamente suspeita.
Thomas Mann, A montanha Mágica