domingo, 6 de novembro de 2022

 


O labirinto como o amor, como o amor para algo ou para alguém, o amor para o labirinto. O amor que inicia sua longa viagem desde qualquer ponto para nenhum lugar; o amor que é o vaivém, a tempestade, o tremor água embaixo, o inoportuno das pontes , o regresso para nós mesmos, o impossível juramento do esquecimento. O amor e a sua morte: por isso estamos presos e as dimensões de nossos cárceres – como escreve Gasparini – “são equivalentes à desmesura interior que nos encandeia.”

Existem tantos labirintos que é impossível supor a exemplificação contrária: pintores, poetas, músicos, filósofos, amantes, errantes, piedosos, deuses , arquitetos. Todas as vidas se movem entre labirintos: o labirinto das almas que mal se reconfortam com suas indecisões e sofrem; o labirinto da língua que escreve, e escava e morde e não conclui jamais o poema; o labirinto das paixões que se desencandeiam para o vazio; o labirinto da voz que não acaba por expressar-se; o labirinto da memória que lembra e esquece ao mesmo tempo.

Algumas coisas começam pela palavra e continuam o caminho da sensação, da percepção, do conhecimento. Outras coisas nunca são palavras e mesmo assim exibem a dupla forma de seu desassossego e de seu encantamento. O labirinto é tudo, porque é detenção e é movimento: trata-se de olhar-nos nos olhos; não de conhecer-nos; trata-se de dar-nos palavras, não de negociar o espanto; trata-se de cruzar os olhos, não de cruzar os braços.

As linhas que nos sulcam - pelo dever, pelo cumprimento, pela necessidade,  pela vida que passou – nos deixam rugas. Mas não só. Também nos oferecem a possibilidade da narrativa, do relato, de contar o que nos acontece. (...)

Entrar ou sair do labirinto não é a questão. Trata-se, isso sim, de sustentar – sem a grandiloquência dos heróis, nem a forçada apatia das vítimas – esse estranho relato de uma vida que permanece no meio do labirinto. Um labirinto que é , então, a forma disforme que assume nossa vida e nossa língua para poder ser narrada.


Desobedecer a linguagem: Educar

Por Carlos Skliar