domingo, 6 de novembro de 2022

Amores proibidos



Onde está quem amamos quando amamos

outro corpo de fogo em movimento?

Pra que abismo corremos, pra que enganos,

quando as promessas são poeira ao vento?


De que matéria alheia mal tentamos

fugir quando a verdade mora dentro

de alguém a cujo céu nos entregamos

numa noite de sonho e de tormento?


Ainda somos humanos se traímos

por instinto um amor de tantos anos

e só àquele instante obedecemos?


Ainda somos humanos? Ou seremos

a febre que há no sangue quando vimos

de súbito morrer num corpo e vamos

em busca do inferno que merecemos?


Talvez por um momento então sejamos

sonâmbulos fantasmas do que fomos

reflectidos num espelho que não vemos


Ou talvez nesse corpo descubramos

a memória da alma que perdemos

pra sempre no momento em que transpomos

a fronteira dos gestos quotidianos

e ao sabor de um desejo destruímos

todas as intenções, todos os planos,

em nome dos prazeres mais supremos

na noite em que deixamos de ser donos

do nosso próprio corpo e abandonamos

angústias e remorsos e partimos

em busca da manhã que não sabemos


Onde está quem amamos quando somos

mais do que humanos? Mais? Ou muito menos?


Fernando Pinto do Amaral