quarta-feira, 12 de outubro de 2022

É como se as paredes respirassem

 

John Paul


É como se as paredes respirassem

e os cheiros misturados se sentissem

e todas as palavras não calassem

embora no silêncio se fundissem

É como se o olhar soubesse o toque

e o toque adivinhasse o que não visse

mas visse no murmúrio o mesmo enfoque

na imagem que se viu mas não se disse

É como se a manhã não mais chegasse

e o dia fosse noite todo o dia

É como não querer que se acabasse

o instante em cada instante que se adia

   e o teto fosse o chão e o chão o teto

   e toda a atmosfera fosse afeto

 

 É como se de pétalas chovesse

o lustre mas tal chuva não caísse

É como se o desejo percebesse

aquilo que a razão não mais medisse

É como se a pergunta respondesse

e o ventre da resposta perguntasse

É como não se ouvisse e compreendesse

o mínimo cicio que faltasse

É como se arranhasse e não ferisse

e tudo o que sentisse, delicasse

É como se dos poros se parisse

a alma em cada gota que suasse

   e o gosto fosse o gosto de um só gosto

   e o fogo não soubesse de qual rosto

 

E sem que se pedisse, se virasse

e em forma de pirâmide se erguesse

Uma mão que no espelho se agarrasse

e a outra o travesseiro pertencesse

e o beijo noutra boca deslizasse

e enquanto esse subisse, essa descesse

e a boca desse beijo se molhasse

e o beijo nessa boca mais bebesse

e o que não fosse beijo se encostasse

e a boca mais ainda recebesse

e o beijo no pescoço assemelhasse

da boca que pulsasse a que gemesse

  e o mais só sussurrasse, sussurrasse

  e sem que se dormisse, mais sonhasse

  

Antoniel Campos