quinta-feira, 19 de agosto de 2021

Um poema



Em plena luta de classes
escreveu um poema de amor.

Acossado pela fome de justiça
escreveu um poema de amor.

Entre a tortura e a morte
escreveu um poema de amor.

Entre o sangue e as balas
escreveu um poema de amor.

um poema de amor para ninguém,
para uma mulher que não existia.

Agora,
amado até à raiz da sua sombra
por esta mulher que lhe beija as feridas,

agora,
que na noite gelada ela o cobre com o seu corpo nu,
arma-se com papel e lápis
salta da cama
e sem perturbar o sono da sua amada
escreve um poema social

um poema estremecido por lutas e batalhas
um poema por cujos versos passam
pedindo justiça
as massas camponesas e operárias.


Joaquim Pessoa