segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014



As fantasias das pessoas são menos fáceis de observar do que o brincar das crianças. A criança, é verdade, brinca sozinha ou estabelece um sistema psíquico fechado com outras crianças, com vistas a um jogo, mas mesmo que não brinque em frente dos adultos, não lhes oculta seu brinquedo. O adulto, ao contrário, envergonha-se de suas fantasias, escondendo-as das outras pessoas. Acalenta suas fantasias como seu bem mais íntimo, e em geral preferiria confessar suas faltas do que confiar a outro suas fantasias. Pode acontecer, consequentemente, que acredite ser a única pessoa a inventar tais fantasias, ignorando que criações desse tipo são bem comuns nas outras pessoas. A diferença entre o comportamento da pessoa que brinca e da fantasia é explicada pelos motivos dessas duas atividades, que, entretanto, são subordinadas uma à outra.
O brincar da criança é determinado por desejos: de fato, por um único desejo – que auxilia o seu desenvolvimento -, o desejo de ser grande e adulto. A criança está sempre brincando ‘de adulto’, imitando em seus jogos aquilo que conhece da vida dos mais velhos. Ela não tem motivos para ocultar esse desejo. Já com o adulto o caso é diferente. Por um lado, sabe que dele se espera que não continue a brincar ou a fantasiar, mas que atue no mundo real; por outro lado, alguns dos desejos que provocaram suas fantasias são de tal gênero que é essencial ocultá-los. Assim, o adulto envergonha-se de suas fantasias por serem infantis e proibidas.


Sigmund Freud em "Escritores Criativos e Devaneio"