terça-feira, 27 de agosto de 2013
O símbolo perdido
Embora muitas pessoas interpretassem equivocadamente apocalipse como o cataclísmico fim do mundo, a palavra na verdade significa “revelação”... O “desvelamento”, como os antigos prediziam, de um grande saber. A futura era da iluminação. Ainda assim, Langdon não conseguia imaginar uma mudança tão grande sendo iniciada por... uma palavra.”
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Toda cultura no mundo tinha seu livro sagrado, seu próprio Verbo. Um diferente do outro, mas, no fundo, todos iguais. Para os cristãos, a Palavra era a Bíblia; para os muçulmanos, o Alcorão; para os judeus, a Torá; para os hindus, os Vedas, e assim por diante.
A palavra iluminará o caminho.
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Sei que você é cético, Robert, mas pense no seguinte: Se a Bíblia não contém um significado oculto, por que tantas das melhores mentes de todos os tempos, incluindo cientistas brilhantes da real Sociedade de Londres, ficaram tão obcecadas com o seu estudo? Sir Isaac Newton escreveu mais de um milhão de palavras na tentativa de decifrar o verdadeiro significado das Escrituras, incluindo um manuscrito de 1704, alegando que ele havia extraído informações científicas ocultas da Bíblia!
Langdon sabia que isso era verdade.
- E Sir Francis Bacon – prosseguiu Peter -, o erudito contratado pelo rei Jaime para literalmente criar a versão oficial da Bíblia King James, ficou tão convencido de que as Escrituras continham um significado cifrado que escreveu seus próprios códigos, ainda estudados até hoje. Como você sabe, é claro, Bacon era rosa-cruz e escreveu A sabedoria dos antigos. – Peter sorriu. – Até mesmo o poeta iconoclasta William Blake sugeriu que deveríamos ler nas entrelinhas.
Langdon conhecia o verso:
Nós dois lemos a bíblia dia e noite
Mas tu lês negro onde eu leio branco.
- E não foram só os eruditos europeus – continuou Peter, começando a descer os degraus mais depressa. – Foi aqui, Robert, bem no coração desta jovem nação norte-americana, que os mais brilhantes de nossos pais fundadores, John Adams, Ben Franklin, Thomas Paine, alertaram sobre os graves perigos de se interpretar a Bíblia de forma literal. Na verdade, Thomas Jefferson estava tão convencido de que a verdadeira mensagem das Escrituras estava escondida que recortou as páginas e reeditou o livro, tentando, em suas próprias palavras, “eliminar a estrutura artificial e restaurar as doutrinas genuínas”.
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Por que os profetas, os maiores professores da história, iriam cifrar sua linguagem? Se queriam mudar o mundo, por que falariam em código? Por que não se expressariam com clareza para que todos pudessem entender?
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- Buda disse: “Você mesmo é Deus.” Jesus ensinou que “O reino de Deus está entre vós” e chegou até a nos prometer que “Quem crê em mim fará as obras que faço e fará até maior do que elas”. Até mesmo o primeiro antipapa, Hipólito de Roma, citou a mesma mensagem, dita pela primeira vez pelo erudito gnóstico Monoimus: “Abandone a busca por Deus... em vez disso, procure por ele tomando a si mesmo como ponto de partida.”
Langdon se lembrou da Casa do Templo, onde a cadeira do Cobridor da loja trazia, em seu espaldar, a inscrição: CONHECE-TE A TI MESMO.
- Um homem sábio me disse certa vez: a única diferença entre você e Deus é que você se esqueceu de que é divino – contou Peter com um fiapo de voz.
- Peter, entendo o que você está falando... de verdade. E adoraria acreditar que somos divinos, mas não vejo deuses andando sobre a Terra. Não vejo pessoas com poderes sobre-humanos. Você pode citar os supostos milagres da Bíblia, ou qualquer outro texto religioso, mas tudo isso não passa de velhas histórias fabricadas pelo homem que o tempo se encarregou de exagerar.
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Quando começar a entender as parábolas crípticas, Robert, você vai perceber que a Bíblia é um estudo da mente humana.
Langdon encolheu os ombros.
- Acho que vou ter que ler tudo de novo
- Deixe-me fazer uma pergunta – disse ela, obviamente sem apreciar seu ceticismo – quando a Bíblia nos diz que devemos “construir nosso templo” e fazer isso “sem ferramentas e sem ruído”, de que templo você acha que ela está falando?
- Bem, o texto diz que o nosso corpo é um templo.
- Sim, em Coríntios 3:16 Vós sois o templo de Deus. – ela sorriu. (...)
Você já viu um cérebro humano de verdade? Ele é constituído por duas partes: uma externa, chamada dura-máter, e outra interna, chamada pia-máter. Essas duas partes são separadas pela membrana aracnoide, um véu de tecido que parece uma teia de aranha.
Langdon inclinou a cabeça, surpreso.
Com delicadeza, ela ergueu a mão e tocou a têmpora de Langdon.
- Existe um motivo para temple, em inglês, significar tanto “têmpora” quando “templo”, Robert.
Enquanto Langdon tentava processar o que Katherine acabara de dizer, lembrou-se inesperadamente do Evangelho gnóstico segundo Maria: Onde a mente está, lá está o tesouro.
- Talvez você tenha ouvido falar – disse Katherine, baixando o tom de voz – nos exames de ressonância magnética feitos em iogues meditando. Quando em estado avançado de concentração, o cérebro humano produz, por meio da glândula pineal, uma substância parecida com cera. Essa secreção cerebral não se parece com nenhuma outra substância do corpo. Ela tem um efeito incrivelmente curativo, é capaz de regenerar células e talvez seja um dos motivos por trás da longevidade dos iogues. Isso é ciência, Robert. Essa substância tem propriedades inconcebíveis e só pode ser criada por uma mente em estado de profunda concentração.
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- Segundo Mateus 6:22 – disse ela com animação -, “Quando o teu olho for bom, todo o teu corpo terá luz”. Esse conceito também é representado pelo chacra ajna e pelo pontinho na testa dos hindus que...
Katherine se deteve abruptamente, parecendo encabulada.
- Desculpe... sei que estou falando sem parar. Mas é que acho tudo isso tão emocionante! Passei anos estudando as afirmações dos antigos sobre o incrível poder mental do homem, e agora a ciência está nos mostrando que o acesso a esse poder se dá, na verdade, por meio de um processo físico. Se usado corretamente, nosso cérebro pode invocar poderes literalmente sobre-humanos. A bíblia, como muitos textos antigos, é uma exposição detalhada da máquina mais sofisticada de todos os tempos... a mente humana. – ela deu um suspiro. – Por incrível que pareça, a ciência ainda não alcançou todo o potencial da mente.
- Parece que seu trabalho como a noética vai representar um salto à frente nessa área.
- Talvez seja um salto trás – disse ela. – Os antigos já conheciam muitas das verdades científicas que estamos redescobrindo atualmente. Em questão de anos, o homem moderno será forçado a aceitar algo hoje impensável: nossas mentes podem gerar energia capaz de transformar a matéria física. – Ela fez uma pausa. – As partículas reagem aos pensamentos... o que significa que nossos pensamentos tem o poder de mudar o mundo.
Langdon abriu um leve sorriso.
- Minha pesquisa me fez acreditar nisto: Deus é muito real... uma energia mental que permeia tudo – disse Katherine. – e nós, seres humanos, fomos criados a essa imagem...
- Como assim? – interrompeu Langdon. – Criados à imagem de... uma energia mental?
- Exatamente. Nossos corpos físicos evoluíram com o tempo, mas nossas mentes é que foram criadas à semelhança de Deus. Nós estamos levando a Bíblia muito ao pé de letra. Aprendemos que Deus nos criou à sua imagem, mas não são nossos corpos físicos que se assemelham a Deus, são nossas mentes. (...) – Nós somos criadores, mas ainda assim ficamos ingenuamente fazendo o papel de criaturas. Vemos a nós mesmos como ovelhas indefesas, manipuladas pelo Deus que nos criou. Nos ajoelhamos como crianças assustadas, implorando ajuda, perdão, boa sorte. Mas, quando percebermos que somos realmente feitos à imagem do Criador, vamos começar a entender que nós também devemos ser criadores. Assim que entendermos esse fato, as portas do potencial humano irão se escancarar.
Langdon se lembrou de um trecho da obra do filósofo Manly P. Hall: Se o infinito não quisesse que o homem fosse sábio, não teria lhe dado a faculdade de saber. Langdon tornou a erguer os olhos para a Apoteose de Washington – a ascensão simbólica do homem à divindade. A criatura... se transformando em Criador.
- O mais incrível de tudo – disse Katherine – é que, assim que nós, humanos, começarmos a dominar nosso verdadeiro poder, teremos enorme controle sobre o mundo. Seremos capazes de projetar a realidade em vez de simplesmente reagir a ela.
Langdon baixou os olhos.
- Parece... perigoso.
Katherine ficou surpresa... e impressionada.
- Isso, exatamente! Se os pensamentos afetam o mundo, então precisamos tomar muito cuidado com a maneira como pensamos. Pensamentos destrutivos também têm influência, e todos sabemos que é muito mais fácil destruir do que criar.(...) A grande ironia é que, durante séculos, todas as religiões do mundo incentivaram seus seguidores a abraçar os conceitos de fé e crença. Agora a ciência, que passou muitos séculos desprezando a religião ao considerá-la mera superstição, está sendo obrigada a admitir que sua próxima grande fronteira é literalmente a ciência da fé e da crença... o poder da convicção e da intenção. A mesma ciência que erodiu nossa fé nos milagres está agora construindo um aponte para atravessar o abismo que criou.
Dan Brown, O símbolo perdido