Exercício 1
Se permitires
Traço nesta lousa
O que em mim se faz
E não repousa:
Uma Ideia de Deus.
Clara como Cousa
Se sobrepondo
A tudo que não ouso.
Clara como Cousa
Sob um feixe de luz
Num lúcido anteparo.
Se permitires ouso
Comparar o que penso
A Ouro e Aro
Na superfície clara
De um solário.
E te parece pouco
Tanta exatidão
Em quem não ousa?
Uma ideia de Deus
No meu peito se faz
E não repousa.
E o mais fundo de mim
Me diza apenas: Canta,
Porque à tua volta
É noite. O Ser descansa.
Ousa.
Exercício 2
Épura, que translúcida
Se projeta.
Épura, feixe solar,
E de cristal. E ereta.
Épura, réstia de luz
Sobre a mão destra.
Épura, que a um só tempo
Se renova. E sem limite
Ou aresta
Toma corpo no Todo
E recomeça.
Exercício 3
Dentro do prisma
A base, o vértice
De suas três
Pirâmides contínuas.
Dentro do prisma
A ideia
Que perdura e ilumina
O que já era em mim
De natureza pura.
Dentro do prisma
O universo
Sobre si mesmo fechado
Mas aberto e alado.
Dentro de mim,
De natureza ígnea:
Uma ideia do Amado.
Exercício 4
De espaço-tempo
De corpo e campo
Teu fundamento.
E teu nome é matéria.
Única. De estrutura
Infinitamente múltipla.
E se teu vértice pousa
Te fazes igualmente
Em Delta. E repousas.
Em ti
Começaria a minha ideia.
Exercício 5
E se a mão se fizer
De ouro e aço,
Desenharei o círculo.
E dentro dele
O equilátero.
E se a mão não puder,
Hei de pensar o Todo
Sem o traço.
E se o olhar
A um tempo se fizer
Sol e compasso
Medita:
Retículo de prata
Esfera e asa
Tríplice
Una
E infinita.
Exercício 6
E de todos os rumos
Pensei
(Como quem vê a prumo)
Um só núcleo pulsando
Claro-Escuro.
Se quiseres
Chamaremos de Delta
O feixe que se esconde,
E Eta o júbilo de ser
Área de luz e cone.
E se o núcleo é um só,
É lícito entenderes
O que Delta resguarda
Do teu olhar alerta
E poderás dizer
Que um e outro
São infinitos-extensos
De um só Ser.
Exercício 7
Vereis em cada círculo
Três dimensões de um todo
Aparentemente bipartido.
Alfa se refaz. É expansão
E é cíclico. Ômega se contrai
Em nova direção. Em essência
Alimenta-se
Daquela que é princípio.
Mas sempre é o mesmo Ser
Num movimento líquido
De inspiração-expiração.
Sem finitude ou arbítrio.
Hilda Hilst, Exercícios, Editora Globo, p. 29-36