segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Você sabe que há jesuítas que não aceitam negros na comunidade? Ah, como eles são limpos, não? Por isso, minha filha, é preciso pensar em outros apóstolos porque muitos cuspiram na face do Cristo. Aqui, na minha cidade, eu encontrei um jesuíta na farmácia. Na frente da farmácia, você pode ver, temos a capela e o colégio. Você já viu a capela? Olha, é enorme, com vitrais enormes. Quanto custa o metro quadrado de vitral? É, velha, custa o olho. Eu disse para o jesuíta: o senhor pode me explicar por que se constróem templos assim como o seu templo? Assim como? Assim grande e assim caro. Ahn, para louvar O Senhor. É... é... mas o Senhor está farto de besteiradas, O Senhor quer muitas escolinhas, muita comidinha para as criancinhas, O Senhor quer menos burrice, mais limpeza, O Senhor quer sacerdotes limpos (pois é, eu vim comprar um desodorante, minha senhora) limpos, mas não basta desodorizar as vossas fundas axilas (minha senhora, por favor)) é preciso desodorizar a mente de muitos jesuítas, ouviu? (A senhora quer um calmante?) Você sabe que na Índia, em algumas aldeias, as criancinhas de seis anos vão para os bordéis? Olha, você sabe também que se elas não fossem para os bordéis e não morressem logo depois, deformadas, elas morreriam de qualquer jeito, de fome? Aqui, quero dizer, lá, no nordeste (ai, o nordeste, meu Deus) é assim: o homem bate na porta: como vai dona, bom dia, vim fazer uma visitinha. A mãe das menininhas que estão dentro da casa, manda o homem entrar. O homem toma um cafezinho, fala no tempo, disfarça, depois a mãe das menininhas também disfarça e diz que precisa sair. Sai. Aí o homem fica lá, trepa nas menininhas e deixa um dinheiro para a barriga de amanhã.


Hilda Hilst