terça-feira, 13 de novembro de 2012

O sono das águas

© Natalia Drepina



Há uma hora certa, 
no meio da noite, uma hora morta, 
em que a água dorme. Todas as águas dormem: 
no rio, na lagoa, 
no açude, no brejão, nos olhos d´água, 
nos grotões fundos. 
E quem ficar acordado, 
na barranca, a noite inteira, 
há de ouvir a cachoeira 
parar a queda e o choro, 
que a água foi dormir… 
Águas claras, barrentas, sonolentas, 
todas vão cochilar. 
Dormem gotas, caudais, seivas das plantas, 
fios brancos, torrentes. 
O orvalho sonha 
nas placas da folhagem. 
E adormece 
até a água fervida, 
nos copos de cabeceira dos agonizantes… 
Mas nem todas dormem, nessa hora 
de torpor líquido e inocente. 
Muitos hão de estar vigiando, 
e chorando, a noite toda, 
porque a água dos olhos 
nunca tem sono…


Guimarães Rosa