segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Dicionário

Perry Gallagher


As palavras mais belas são as que nascem 
do teu corpo: cabelos, lábios, ombros, seios,
até o ventre, e o que entre as coxas se esconde.
Escrevo-as devagar, como se lhes tocasse; e 
cada uma delas é como um espelho, de onde 
se libertam as tuas mãos, os dedos, um joelho, 
olhos que beijo num murmúrio de segredos.

E pedes-me significados, símbolos, primeiros
e segundos sem idos. Não te sei dizer senão que 
corpo é o teu corpo, centro um secreto umbigo, 
pele a mais branca neve no horizonte desta 
subida leve. Se me estendes os braços, entro 
num abrigo de floresta: se me abres os ramos, 
é na mais doce gruta que entramos.

Precipitam-se sinônimos, adjetivos sem 
objetivo, pronomes enfáticos e possessivos, 
sílabas perdidas na falésia do desejo. Mas 
fecho o livro. Estou farto de palavras, é a ti 
que eu quero. E faço-as voltar até de onde 
nasceram: cabelos, lábios, ombros, seios, até 
o ventre, e o que entre as coxas se esconde.


Nuno Júdice