Estes poemas, estes poemas,
estes poemas, disse ela, são poemas
sem amor lá dentro. São os poemas dum homem
capaz de deixar mulher e filho por lhe
fazerem barulho no escritório. São os poemas
dum homem capaz de matar a própria mãe a fim de clamar
pela herança. São os poemas dum homem
como Platão, disse ela, querendo denotar coisa que não
entendi mas que mesmo assim
me ofendeu. São os poemas dum homem
que a dormir com mulheres prefere dormir com
ele próprio, disse ela. São os poemas dum homem
com olhos como naifas aguçadas, mãos iguais às dum
gatuno, urdidas de água e lógica
e fome, sem fibra de amor nelas. São
tão sem coração estes poemas como o piar de aves,
tão involuntários como folhas de ulmeiro, que, se amam, amam apenas
o vasto céu azul e o ar e a ideia
das folhas do ulmeiro. Amor-próprio é um fim, disse ela,
não é origem. Amor quer dizer amor
daquilo que se canta, não da canção nem do cantar.
Estes poemas, disse ela...
E diz ele: Como és bela.
Isso não é amor, retorquiu com justeza.
Robert Bringhurst
A Beleza Das Armas. Antígona, 1994