quinta-feira, 31 de maio de 2012


“— Sempre achamos que são demasiadamente estreitos os limites de nossa personalidade! Atribuímos à nossa pessoa somente aquilo que distinguimos como individual e divergente. Mas cada um de nós é um ser total do mundo, e da mesma forma como o corpo integra toda a trajetória da evolução, remontando ao peixe e mesmo a antes, levamos em nossa alma tudo o quanto desde o princípio está vivendo na alma dos homens. Todos os deuses e todos os demônios que já existiram, quer entre os gregos, os chineses ou os cafres, todos estão conosco, todos estão presentes, como possibilidades, desejos ou caminhos. Se toda a humanidade perecesse, com exceção de uma só criança medianamente dotada, esse menino sobrevivente tornaria a encontrar o curso das coisas e poderia criar tudo de novo: deuses, demônios e paraísos, mandamentos e proibições, antigos e novos Testamentos.
— Pois bem — objetei-lhe. — Mas que fim leva o valor do indivíduo? Para que aspiramos a algo se já temos tudo concluído em nós mesmos?
— Alto lá! — exclamou Pistórius com força. — Há muita diferença entre levarmos simplesmente o mundo em nós mesmos e conhecê-lo.”


Hermann Hesse, em “Demian”