A minha mente teme
Algo que, ainda preso nas estrelas,
Vai começar um dia malfadado
Com a festa dessa noite, e ver vencido
O termo desta vida miserável
Com a pena vil da morte inesperada.
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Benvólio – Ora, uma chama apaga outra chama,
Cada angústia reduz uma outra dor:
Alegre-se com a dor que hoje reclama,
O desespero cura a dor menor.
Pegue nova infecção no seu olhar,
Que o seu veneno a outra há de matar.
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Romeu – Ela é que ensina as tochas a brilhar,
E no rosto da noite tem um ar
De joia rara em rosto de carvão.
É riqueza demais pro mundo vão.
Como entre corvos pomba alva e bela
Entre as amigas fica essa donzela.
Depois da dança, encontro o seu lugar,
Pra co’a mão dela a minha abençoar.
Já amei antes? Não, tenho certeza;
Pois nunca havia eu visto tal beleza.
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Julieta – Nasce o amor desse ódio que arde?
Vi sem saber, ao saber era tarde.
Louco parto de amor houve comigo,
Tenho agora de amar meu inimigo.
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Coro – Mal a antiga paixão agonizava
E o novo amor já quer o lugar dela;
A bela por quem ontem se matava
Junto a Julieta nem sequer é bela.
Agora amado, ama outra vez Romeu,
Ambos presa do aspecto exterior;
Ele leva à inimiga o pranto seu
E ela tira do ódio doce amor.
Inimigo, a Romeu fica vedado
Fazer as juras naturais do amor,
E a ela, apaixonada, não é dada
Ir encontrá-lo, seja onde for.
Mas a paixão, à força, os faz vencer,
Temperando o perigo co’o prazer.
William Shakespeare, Romeu e Julieta