sexta-feira, 23 de dezembro de 2011




Brincas todos os dias com a luz do universo.
Visitante sutil, chegas na flor e na água.
És mais do que essa clara cabeça que aperto
como entre as mãos um cacho de uvas, cada dia.

A ninguém te pareces desde que te amo.
Deixa-me estender-te entre grinaldas amarelas.
Quem escreve o teu nome com letras de fumo entre as estrelas do sul?
Ah, deixa-me recordar-te como eras outrora quando não existias.

De súbito o vento ulula e me golpeia a janela fechada.
O céu é uma rede cheia de peixes sombrios.
Aqui vêm ter todos os ventos, todos.
Aqui despe-se a chuva.

Passam fugindo os pássaros.
O vento. O vento.
Posso lutar apenas contra a força dos homens.
O temporal remoinha folhas escuras
e solta todas as barcas que de noite atracaram no céu.

Tu estás aqui. Ah tu não foges.
Tu me responderás até ao último grito.
Encolhe-te a meu lado como se tivesses medo.
Não obstante algumas vezes passou uma sombra estranha por teus olhos.

Agora mesmo, pequena, me trazes madressilvas,
e até os seios trazes perfumados.
Enquanto o vento triste galopa matando borboletas
eu te amo e minha alegria morde tua boca de ameixa.

Quanto te haverá doído acostumar-te a mim,
à minha alma só e selvagem, ao meu nome que todos afugentam.
Já vimos tantas vezes arder o luzeiro no céu beijando-nos os olhos,
e sobre as nossas cabeças destorcer-se os crepúsculos em leques girantes.

Em ti minhas palavras choveram afagando-te.
Amei de há muito tempo o teu corpo de queimado nácar.
Creio-te até senhora do universo.
Hei de trazer-te das montanhas flores alegres, amarílis,
avelãs escuras, e cestas silvestres de beijos.
Quero fazer contigo
o que faz a primavera às cerejeiras.

Pablo Neruda