Eu tenho os braços hirtos, imóveis, enregelados
e vazios,
como galhos fantásticos, desfolhados
em hibernais arrepios.
Há em mim uma árvores triste e silenciosa,
nostálgica de cigarra e de pássaros cantores,
uma árvores parada
à margem do caminho
- as mãos aflitas pra o ar, sem o adorno das flores!
a alma sem mais um som! A fronde sem mais um ninho,
sinto-me nessa árvore de longos ramos desnudos,
na aflitíssima espera
de que enfim chegue o sol e acorde os campos mudos,
na gritaria verde da vegetação
e na policrômica explosão
da primavera!
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Então, eu fugirei com o espírito das fontes
argentinas
no silêncio bucólico da mata,
das fontes, que como um bando de meninas
tem longos cabelos como serpentinas
com reflexos de prata!
E cantarei com as aves felizes e tagarelas
e dançarei com o vento em remoinhos
o bailado das folhas amarelas
que endoideceram pelos caminhos!
Partirei com as nuvens livres, na debandada do poente
quando a noite chegar silenciosamente...
Subirei a montanha pelo caminho do luar
e descerei com ele, e avançarei com ele
sobre o mar...
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Oh, o tédio doloroso que me dilacera
numa esperança cada vez mais vã,
as que sendo esperança, ainda vive, ainda espera,
pela festa do sol na aleluia pagã
da primeira manhã
de primavera!
Partirei! Sonharei! Cantarei!
na liberdade total dos movimentos,
como as nuvens, como as fontes, como os ventos,
sem limites, sem lei!
E viverei! E viverei! E viverei!
( Poema de J.G . de Araujo Jorge
extraído do livro "Cânticos" - 1941)