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Minako Saitoh Botsford |
É para ti a flor que apanhei na colina.
No penhasco que sobre o oceano se inclina,
E que só pode ser por águias acercado,
Em paz, crescia em meio às fendas do rocado.
A sombra ia banhado o triste promontório;
Eu via erguer em tão glorioso território,
Qual arco triunfal, vermelho e cintilante,
Onde fora engolido o sol, astro reinante,
O nuvioso portal da noite escurecida.
Naus fugiam ao longe assim diminuídas;
E tetos, reluzindo ao fundo de um desvão,
Pareciam temer que os vissem ao clarão.
É para ti a flor que apanhei bem-amada.
É pálida e não tem corola perfumada.
Sua raiz tomou nos montanhosos cimos
Somente o amargo odor daqueles glaucos limos;
Eu disse: "Pobre flor, do píncaro alteroso
`Tu devias cair no abismo cavernoso
`Para onde a alga, as naus e as nuvens sempre vão.
`Morre no abismo mais profundo, o coração.
`Fana no peito em que há um mundo a palpitar.
`Determinou-te o céu na onda desfolhar,
`Fez-te para o oceano, e te oferto ao amor."
O vento misturava as ondas, e um fulgor
Confuso e levemente apagado era o dia.
Oh! Com a flor, pensando, o quão me entristecia
Com meus sonhos, com a alma imersa na negrura
Da voragem, mesclada às vesperais tremuras!
Victor Hugo
trad. de Renata Cordeiro