sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Três haicais de Benedetti

Koukei Kojima


O pior do eco
É dizer as mesmas
Barbaridades

Eco é a repetição de um som. Você grita, e o seu grito se multiplica, mas nada acontece. Eco é a falta de diálogo. É quando nossa voz não atravessa um canyon, não chega a lugar algum: volta. Você pede aumento de salário: volta. Você reclama do governo: volta. Você chama seu amor: volta! Ele não volta. É surdo como o mundo, que não te escuta.

Koukei Kojima

Os blecautes
Permitem que se negocie
Consigo mesmo

A redução do consumo de energia, que forçosamente virou hábito no país, está fazendo com que televisores e computadores passem mais tempo desligados. Sem a interatividade com as telas, resta a interatividade com o espelho. Quem sou eu quando não estou assistindo a futebol? O que penso quando os outros não estão pensando por mim? Por que choro se não estou vendo nenhuma cena triste? O silêncio conquista o horário nobre. Pessoas viram roteiristas de si mesmas, escrevendo monólogos em suas cabeças e criando diálogos com os outros: é o contrário do eco. Recuperam-se assuntos que não costumam ser debatidos em cadeia nacional. Resgata-se a extinta conversa em família.

Koukei Kojima

Somos tristeza
Por isso a alegria
É uma pobreza

Ninguém nos escuta. Perguntas ficam sem resposta. Nossas orações não são atendidas. Há canyons por todos os lados. Eco... eco... eco... E tristes tocamos a vida, porém valentes, e vez que outra descobrindo um prazer inesperado em pequenas coisas, como um papo franco, um ouvido atento, uma mão estendida, gestos que aproximam. Proezas que cabem em poemas mínimos, como os do uruguaio Mário Benedetti, captador sensível da alma humana.


Martha Medeiros