domingo, 28 de novembro de 2010
Oscar Wilde, O Retrato de Dorian Gray (7)
- Está falando sério?
- Absolutamente sério, Basil. Eu me lastimaria, se soubesse que fui alguma vez mais sério do que estou sendo neste momento.
- Mas aprova isso, Harry? – perguntou o pintor, andando de um lado para outro na saleta e mordendo o lábio.
- Não, não pode aprovar. Isso não passa de uma enfatuação absurda!
- Eu agora nunca aprovo nem reprovo nada. Aprovar e reprovar são atitudes absurdas para com a vida. Não viemos ao mundo para dar largas aos nossos preconceitos morais. Jamais presto atenção ao que diz o vulgo, nunca interfiro no que fazem as pessoas simpáticas. Quando uma personalidade me fascina, seja qual for o modo de expressão escolhido por essa personalidade, considero-o absolutamente satisfatório. Dorian Gray apaixonou-se por uma linda pequena que personifica Julieta, e pretende casar com ela. Por que não? Se casasse com Messalina, nem por isso seria menos interessante. Você sabe que eu não sou um paladino do casamento. O verdadeiro inconveniente do casamento é que ele extingue em nós o egoísmo. E os seres sem egoísmo são incolores. Carecem de personalidade. Ainda assim. Há temperamentos que o estado conjugal torna mais complexos. Esses conservam o seu egotismo e acrescentam muitos outros “egos”. Obrigados por isso a viver uma vida múltipla, tornam-se superiormente organizados. E ser superiormente organizado é, a meu ver, a finalidade da existência do homem. Ademais, toda experiência tem valor, e, diga-se o que disser, o casamento é sem dúvida uma experiência. Espero que Dorian Gray case com essa menina, que a adore apaixonadamente seis meses, e depois, da noite para o dia, apaixone-se por outra. Seria um objeto de estudo maravilhoso.
- Você não pensa uma palavra do que diz, Harry. Sabe que não. Se Dorian Gray se desgraçasse, ninguém o sentiria mais do que você. É muito melhor do que blasona ser.
Lorde Henry soltou uma risada.
- O motivo do nosso empenho em julgar bem o próximo é que temos medo de nós mesmos: a base do otimismo é puro receio. Consideramo-nos generosos, porque atribuímos aos nossos semelhantes as virtudes que nos podem ser úteis. Elogiamos o banqueiro que está em condições de nos proporcionar crédito; enxergamos boas qualidades num salteador, com a esperança de que ele nos poupe os bolsos. Eu penso tudo o que disse. E desprezo profundamente o otimismo. Quanto a estragar a vida, não há vida estragada, salvo a que deixa de se desenvolver. Se quiser desgraçar uma índole basta reformá-la. O casamento seria absurdo, concordo. Mas há outros laços, e mais interessantes, entre os homens e as mulheres. Eu os favorecerei. Têm o encanto de serem elegantes. E... Aí vem Dorian. Ele lhe dirá mais do que eu posso dizer.
Oscar Wilde, O retrato de Dorian Gray