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Arantza SESTAYO |
Matou-se de paixão ou morreu de preguiça,
Se vive, é só de vício; e deixa apenas isso:
— Não ser a sua amante foi seu maior suplício. —
Não nasceu por nenhum lado
E foi criado como mudo.
Tornou-se um arlequim-guisado,
Mistura adúltera de tudo.
Tinha um não-sei-que, — sem saber onde;
Ouro, — sem trocado para o bonde;
Nervos, — sem nervos; vigor sem “garra”;
Alma, — faltava uma guitarra;
Amor, — mas sem bastante fome.
— Muitos nomes para ter um nome. —
Idealista, — sem idéia. Rima
Rica, — sem matéria-prima;
De volta, — sem nunca ter ido;
Se achando sempre perdido.
Poeta, apesar do verso;
Artista sem arte, — ao inverso;
Filósofo — vide-verso.
Um sério cômico, — sem sal.
Ator: não soube seu papel;
Pintor: dó-ré-mi-fá-sol;
E músico: usava o pincel.
Uma cabeça! — sim, de vento;
Muito louco para ter tento;
Seu mal foi singular de mais.
— Seus pés quebrados, pés demais.
Avis rara — mas de rapina;
Macho... com manha feminina;
Capaz de tudo, — bom para nada;
Com certeza, — por certo errada.
Pródigo como o filho errante
Do Testamento, — herança vacante.
Rebelde, — e com receio do lugar
Comum não saía do lugar.
Colorista sem cavalete;
Incompreendido... — abriu o peito:
Chorou, cantou em falsete;
— E foi um defeito perfeito.
Não foi alguém, nem foi ninguém.
Seu natural era o ar bem
Posto, em pose para a posteridade;
Cínico, na maior ingenuidade;
Impostor, sem cobrar imposto.
— Seu gosto estava no desgosto.
Ninguém foi mais igual, mais gêmeo
Irmão siamês de si mesmo.
Viu-se a si próprio ao microscópio:
Micróbio de seu próprio ópio.
Viajante de rotas perdidas,
S.O.S. sem salva-vidas...
Muito cheio de si para aturar-se,
Cabeça “alta”, espírito ativo,
Findou, sem saber findar-se,
Ou vivo-morto ou morto-vivo.
Aqui jaz, coração sem cor, desacordado,
Um bem logrado malogrado.
Tristan Corbière
Tradução de Augusto de Campos