quinta-feira, 24 de junho de 2010

David Herbert Lawrence, O amante de Lady Chatterley


Mellors não desejava de maneira alguma entrar em contato com uma mulher, tanto os contatos anteriores lhe abriram na alma feridas difíceis de fechar. Se não pudesse ficar completamete só no mundo, certamente morreria. Desligara-se em absoluto do mundo exterior. Seu último refúgio era a floresta - era aquele esconder-se dentro das árvores.
Constance atiçou demais o fogo e logo se sentiu afogueada. Afastou então o tamborete para dentro da porta, de onde podia vê-lo no trabalho. Mellors fingiu não dar por isso. Continuou a trabalhar atentamente, absorvido no que fazia, com o cão sentado nas patas traseiras, a montar guarda.
Lesto, tranquilo e rápido, o homem terminou o galinheiro que estava construindo, virou-o, experimentou a porta corrediça, depois colocou-o de lado. Levantou-se, foi a um velho galinheiro e o levou para o lugar onde estava trabalhando.
Agachando-se, testou as ripas do galinheiro;algumas quebraram-se em suas mãos; e começou a tirar os pregos. Em seguida, virou pra cima o galinheiro, e ficou a considerá-lo, não dando o menor sinal de notar a presença da mulher.
Constance observava-o fixamente. Aquela mesma solidão que sentira nele quando o viu nu, sentira nele agora vestido. Era o homem solitário, aplicado, que se absorve no que faz, mas ao mesmo tempo medita, com a alma afastada de todo contato humano. Silenciosamente, pacientemente, estava a isolar-se dela - e foi justamente essa tranquilidade, essa espécie de paciência infinita o que mais emocionou as entranhas de Constance. Via sua cabeça inclinada, suas mãos ágeis e calmas, a curva dos rins delgada e sensível - algo tão paciente e distante... Ela percebia que a experiência desse homem era mais profunda que a sua - muito mais profunda e ampla, e isso a aliviaria de si mesma, tornando-a irresponsável pela atração sentida.
E assim ficou Lady Chatterley sentada à porta da cabana por largo tempo, completamente alheia a tudo. Tão ausente de si própria se quedara, que a um volver de olhos Mellors a notou, e se surpreendeu do seu ar calmo de espera. Sim, era a mulher à espera do homem - e ao sentir isso uma eletricidade lhe percorreu pelo corpo.

David Herbert Lawrence, O amante de Lady Chatterley