domingo, 16 de maio de 2010
Gabriel García Márquez, Cem Anos de Solidão
... Certa ocasião, José Arcadio olhou para o seu corpo com atenção descarada e disse a ela: “Maninha, você é muito mulher.” Rebeca perdeu o domínio de si mesma. Voltou a comer terra e cal das paredes com a avidez dos outros tempos e chupou o dedo com tanta ansiedade que formou um calo no polegar. Vomitou um líquido verde com sanguessugas mortas. Passou noites em vigília, tiritanto de febre, lutando contra o delírio, esperando até que a casa trepidasse com o regresso de José Arcadio ao amanhecer. Uma tarde, quando todos dormiam a sesta, não agüentou mais e foi ao seu quarto. Encontrou-o de cuecas, acordado, estendido na rede que pendurara nos ganchos com os cabos de amarrar navio. Impressionou-a tanto a sua enorme nudez sarapintada que teve o ímpeto de retroceder. “Perdão”, se desculpou. “eu não sabia que você estava aqui.” Mas abaixou o tom de voz para não acordar ninguém. “Vem cá”, disse ele. Rebeca obedeceu. Deteve-se junto da rede, suando gelo, sentindo que se formavam nós nas tripas enquanto José Aracadio lhe acariciava os tornozelos com a polpa dos dedos, e depois a barriga das pernas e depois as coxas, murmurando: “Ah, maninha; ah maninha.” Ela teve que fazer um esforço sobrenatural para não morrer quando uma potência ciclônica, assombrosamente regulada, levantou-a pela cintura e despojou-a da sua intimidade com três patadas, e esquartejou-a como a um passarinho. Conseguiu dar graças a Deus por ter nascido, antes de perder a consciência no prazer inconcebível daquela dor insuportável, chapinhando no lago fumegante da rede que absorveu como um mata-borrão a explosão do seu sangue.
Gabriel García Márquez, Cem Anos de Solidão