sábado, 1 de maio de 2010

Martha Medeiros, Divã


...Desde criança, o meu desejo maior NÃO ERA visitar a Disney, ou morar num sítio, ou ser menina para sempre: o pó de pirilimpimpim nunca foi meu sonho de consumo. Eu queria era crescer. Ser dona do meu nariz de uma vez por todas . Não ter hora pra dormir, não ter ninguém me dizendo pode isso, não pode aquilo. Não precisar pedir autorização pra nada, poder errar e acertar por conta própria. Isso sim é que deveria ser divertido, eu pensava. Eu não me enganei. Nada é mais encantador do que a independência. Muito mais encantador que a infância. As pessoas cultuam o universo infantil de uma maneira romântica e nostálgica, sentem falta da autenticidade perdida. Mas se a perderam, foi por condicionamento, por acharem que depois de determinada idade toda fantasia é capricho. Não é. Os pensamentos puros, a espontaneidade, a vibração, o deslumbramento, tudo isso eu mantenho e sinto hoje muito mais do que no passado: crescer não me emparedou, ao contrário, me abriu as portas de casa, o portão do colégio, ganhei a chave da rua e a tutela da minha existência. Vivo em busca constante, tento investigar tudo o que me soa estranho, sigo atenta a cada emoção, não me acomodo nem me acostumo com coisa alguma.


Martha Medeiros, Divã