segunda-feira, 12 de abril de 2010

Martha Medeiros, Divã

Rob Hefferan. 

No trajeto, tentei recapitular minha própria história e descobrir em que momento resolvi que não faria parte do mundo, não do jeito que ele me convoca. Quando foi que me exilei, Lopes, e por quê? Nenhuma vida é original. Nascemos e morremos, e no espaço entre uma coisa e outra estudamos, trabalhamos, casamos, temos filhos e netos, praticamos exercícios, adoecemos. Ninguém escapa desse script, não há outras opções. Por isso o álcool, o jazz, o esoterismo, a religião, o kama-sutra: é preciso encontrar alguma fresta, é preciso reinventar uma história que não seja cópia, que não entre para as estatísticas, que escape. Mas mesmo a marginalidade é rotulada, também ela é convencionada, estabelecendo códigos de parecência e grupos fechados onde todos têm, quem diria, a mesma história pra contar.
Talvez isso explique aquela sensação de sermos estrangeiros na própria terra, e a paixão por viajar que a maioria tem. Talvez isso explique a insistência de todos falarem sempre a mesma coisa, fazerem as mesmas perguntas e esperarem pelas mesmas respostas, e satisfazerem assim suas necessidades de convivência social. Em que outro idioma nos faríamos entender, se não o da socialização? Lopes, preciso urgentemente reaprender esses códigos, tenho falado muito sozinha.


Martha Medeiros, Divã