sexta-feira, 30 de outubro de 2009
Nicolas Ségur, O leito conjugal
“Outrora, o casamento era indissolúvel, baseado de um lado sobre o domínio do homem, que era pilar-mestre da casa, o único responsável, e doutro lado, sobre a inferioridade da mulher, a quem só incumbia embalar humildemente o senhor, servi-lo, assegurar a sua continuidade. Nessa época, u’a mulher que se mostrava infiel cometia um crime perante seu senhor e era uma generosidade suprema, da parte deste, o fato de a perdoar. Em nossos dias, com a faculdade do divórcio, [...] e com a decadência dos privilégios masculinos, o casamento tornou-se simples pacto, um modo de associação.
U’a mulher [...] rivaliza com qualquer homem, quanto à educação, à capacidade e ao talento. Rivaliza com ele até mesmo pela firmeza de caráter e punho forte com o qual se avantaja a domar a vida. [...] A maioria dos maridos engana sua mulher. Por que, pois, tendo-se alçado ao mesmo nível social que nós e não mais estando mesmo retidas pelas barreiras morais que faziam suas antepassadas deterem-se, não nos enganariam as mulheres? Por que não pretenderiam elas os memos direitos que nós? Tenhamos coragem de confessar que, em nossa época, o único obstáculo que se opõe ao livre derrame dos instintos da mulher é sua escravatura sensual a um homem, o qual, criando para ela a ilusão do amor, obriga-a mui naturalmente à felicidade. Sim, somente o perpétuo atolar-se produzido pela misteriosa demência que se chama amor, pode manter puros os liames do casamento. [...] Perdoar é, talvez, o único meio que doravante resta ao homem para reter a mulher. E, entretanto, sabes por ti mesmo quanto é difícil perdoar a traição da mulher que se ama."
Nicolas Ségur, O leito conjugal