quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Folhas de rosa



Todas as prendas que me deste, um dia, 
Guardei-as, meu encanto, quase a medo, 
E quando a noite espreita o pôr-do-sol, 
Eu vou falar com elas em segredo ... 

E falo-lhes d'amores e de ilusões, 
Choro e rio com elas, mansamente... 
Pouco a pouco o perfume do outrora 
Flutua em volta delas, docemente ... 

Pelo copinho de cristal e prata 
Bebo uma saudade estranha e vaga, 
Uma saudade imensa e infinita 
Que, triste, me deslumbra e m'embriaga 

O espelho de prata cinzelada, 
A doce oferta que eu amava tanto, 
Que refletia outrora tantos risos, 
E agora reflete apenas pranto, 

E o colar de pedras preciosas, 
De lágrimas e estrelas constelado, 
Resumem em seus brilhos o que tenho 
De vago e de feliz no meu passado... 

Mas de todas as prendas, a mais rara, 
Aquela que mais fala à fantasia, 
São as folhas daquela rosa branca 
Que a meus pés desfolhaste, aquele dia...

Florbela Espanca