“Poetry is when an emotion has found its thought and the thought has found words.”
Robert Frost
Alejandra Pizarnik, Diarios
Se o poema não serve para dar o nome às coisas
outro nome e ao seu silêncio outro silêncio,
se não serve para abrir o dia
em duas metades como dois dias resplandecentes
e para dizer o que cada um quer e precisa
ou o que a si mesmo nunca disse.
Se o poema não serve para que o amigo ou a amiga
entrem nele como numa ampla esplanada
e se sentem a conversar longamente com um copo de vinho na mão
sobre as raízes do tempo ou o sabor da coragem
ou como tarda a chegar o tempo frio.
Se o poema não serve para tirar o sono a um canalha
ou a ajudar a dormir um inocente
se é inútil para o desejo e o assombro,
para a memória e para o esquecimento.
Se o poema não serve para tornar quem o lê
num fanático
que o poeta então se cale.
.
António Ramos Rosa
Emil Cioran (In: “Cadernos: 1957–1972”)
Abro a caixa do poema para descobrir
velhos versos, estrofes que ficaram a meio,
imagens gastas pelo bolor dos anos. Devia
ter deitado tudo para o lixo, no meio
de metáforas sem uso, de aliterações
surdas, de hipérboles furadas como balões
de feira. Mas encontro palavras que ainda
me servem, as que falam de coisas que não
passam, as que trazem um eco de vozes
que voltam a soar aos meus ouvidos, como
se estivessem comigo. E volto a fechá-la,
para não perder o que nunca tive.
Nuno Júdice
também uma forma de amar e de olhar por ti, quando sin-
to a tua vida a pulsar como uma estrela ou um vocábulo e
eu já não tenho perguntas que te faça nem outra forma de
segurar as tuas mãos a não ser a dor e o júbilo de te olhar
com a mesma alegria feliz com que olho uma manhã car-
regada de frutos.
Quando os animais se afastarem caminhando pela tua au-
sência, ainda azuis mas incompletos, restará a sombra das
árvores e a tua recordação na inquietação dos pássaros, ou
a minha antiga tristeza cantando por entre uma floresta de
poemas que escrevi para celebrar, no teu corpo, o canto
inesgotável.
Adiei-me por ti. E por ti ardo, como o velho anjo que pegou
o fogo aos quatro pontos cardeais.
Joaquim Pessoa
Levo comigo o gosto do vinho na boca. (Por todas as coisas boas, dizíamos, todas as coisas cada vez melhores que nos vão acontecer.)
Não levo nem uma única gota de veneno. Levo os beijos de quando você partia (eu nunca estava dormindo, nunca). E um assombro por tudo isso que nenhuma carta, nenhuma explicação, podem dizer a ninguém o que foi.
- Eduardo Galeano, no livro “Vagamundo”
queimadura nos ossos, ferida enamorada, inebriada com o cheiro
das estrelas.
É doce a tua mão, irmã gémea do meu peito, a que espera que a
noite chegue, a que pede amor à minha carne e deposita uma flor
azul no meu cansaço.
Debaixo da lua, a força de ter-te devolve a luz ao mundo, as laran-
jas brancas do teu peito oferecem-me o perfume dos roseirais que
crescem junto ao mar.
Joaquim Pessoa
sombras que passam na rua através das horas, relâmpagos
que não chegam a iluminar as paredes do quarto.
Românticos
que se encontram depois de viver vidas paralelas, cansados – mas enlaçados antes que chegue a hora de partir, sem saberem se amanhã há outro sono igual, ou uma escolha para fazer.
Os dois sabem que são doidos, estendem os dedos na escuridão entre as luas. Os dois sabem que mais adiante podem arder de repente no meio do Verão, consumidos pelos segredos e pela indiferença.
Noites sem sexo são perfeitas, também;
e raras, e condenadas e incompletas.
Nunca estamos preparados, diz um. Nunca estamos, repete o outro, quando a primeira borboleta sossega depois de um beijo em dívida.
Francisco José Viegas
A vida não tem roteiros,
só velas que nos acenam
do mar.
Escuta, amiga,
o desfiar das horas:
elas te dirão é tua
é tua a vida.
Toma-a (como se toma
um cálice de rosas)
na mão.
Antonio Brasileiro
Emil Cioran
Poesia é o diário de um animal do mar vivendo na terra e querendo voar no ar.
Poesia é uma série de explicações da vida dissolvendo-se em horizontes muito cambiantes para explicações.
Poesia é uma busca de sílabas para atirar contra barreiras do desconhecido e desconhecível.
Poesia é o silêncio e a fala entre a raiz úmida e esforçada de uma flor e a florescência iluminada pelo sol daquela flor.
Poesia é o abrir e fechar de uma porta, deixando aqueles que estavam olhando a imaginar o que viram por um breve instante.
Carl Sandburg
castos
meus beijos da manhã
nas suas
costas
gasto
meus beijos de manhã
e você
gosta
adorne
de beijos as manhãs
em que eu te
aderno
afagos
de beijos nas manhãs
em que me
afogas
beba
meus beijos nas manhãs
depois me
babe
astro
nos beijos da manhã
na tua
ostra
nau
de beijos da manhã
pra você
nua
Antoniel Campos
Alejandra Pizarnik | Diarios.
«Dor. Dor de ser. Dor de amar e de não ser amada. Dor da noite acariciando meus cabelos. Dor do mar. Dor da vida passar sem parar na minha porta. Dor de falar e que minhas palavras fiquem ligadas ao vento quem as espalhará por lugares imemoriais. Dor de ser e de não ter vocação para ser. Dor de lidar com tanto amor e não poder deixá-lo em lugar algum porque ninguém quer recebê-lo.
a essência de tua resina e convivido
intimamente com a ponta de teus dedos, com tua loucura.
Nossas peles se roçam, nossas pernas se entrelaçam,
nossos corpos se abraçam
Somos uma mistura.
Cheios de humor, temos a qualidade
da extravagância, o prazer de transgredir,
o deleite da transformação.
Selvagens somos, tigres, sombras nos espelhos,
temos a ilegalidade na alma
e a sabedoria na intuição.
E temos belos corpos, voos rasantes
e o mesmo estratagema.
Um homem, a paixão de um homem,
esse é o meu tema.
Bruna Lombardi