segunda-feira, 25 de dezembro de 2023

ARTE POÉTICA



Se o poema não serve para dar o nome às coisas

outro nome e ao seu silêncio outro silêncio,

se não serve para abrir o dia

em duas metades como dois dias resplandecentes

e para dizer o que cada um quer e precisa

ou o que a si mesmo nunca disse.

Se o poema não serve para que o amigo ou a amiga

entrem nele como numa ampla esplanada

e se sentem a conversar longamente com um copo de vinho na mão

sobre as raízes do tempo ou o sabor da coragem

ou como tarda a chegar o tempo frio.

Se o poema não serve para tirar o sono a um canalha

ou a ajudar a dormir um inocente

se é inútil para o desejo e o assombro,

para a memória e para o esquecimento.

Se o poema não serve para tornar quem o lê

num fanático

que o poeta então se cale.

.

António Ramos Rosa