quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Bonne Année!

fabian perez

Dias maravilhosos em que os jornais vêm cheios de poesia…
E do lábio do amigo brotam palavras de eterno encanto…
Dias mágicos…
Em que burgueses espiam,
através da vidraças dos escritórios,
a graça gratuita das nuvens.


Mário Quintana


Que em 2010 os dias sejam sempre assim...
Feliz ano novo amigos!

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

© Josep de Togores


Na lista dos teus fins venho no fim 
de uma página nunca publicada, 
e é justo que assim seja. Embora saiba 
mexer palavras, e doer de frente, 
e tenha esse talento conhecido 
de acordar de manhã, dormir à noite, 
e ser, o dia todo, como gente, 
nunca curei, como previa, a lepra, 
nem decifrei o delicado enigma 
da letra morta que nos antecede. 
Por muito te querer, talvez pudesses 
dar-me um lugar qualquer mais adiante, 
despir-te de pudor por um instante
 e deixá-lo cobrir-me como um manto. 


António Franco Alexandre 


Segundo ela mesma: "Estou atrás do que fica atrás do pensamento."

"Eu escrevo sem esperança de que o que eu escrevo altere qualquer coisa. Não altera em nada... Porque no fundo a gente não está querendo alterar as coisas. A gente está querendo desabrochar de um modo ou de outro..."

"Aliás - descubro eu agora - eu também não faço a menor falta, e até o que escrevo um outro escreveria."
(A hora da estrela)

Sobre a escrita...

"Meu Deus do céu, não tenho nada a dizer. O som de minha máquina é macio.
Que é que eu posso escrever? Como recomeçar a anotar frases? A palavra é o meu meio de comunicação. Eu só poderia amá-la. Eu jogo com elas como se lançam dados: acaso e fatalidade. A palavra é tão forte que atravessa a barreira do som. Cada palavra é uma idéia. Cada palavra materializa o espírito. Quanto mais palavras eu conheço, mais sou capaz de pensar o meu sentimento.
Devemos modelar nossas palavras até se tornarem o mais fino invólucro dos nossos pensamentos. Sempre achei que o traço de um escultor é identificável por um extrema simplicidade de linhas. Todas as palavras que digo - é por esconderem outras palavras.
Qual é mesmo a palavra secreta? Não sei é porque a ouso? Não sei porque não ouso dizê-la? Sinto que existe uma palavra, talvez unicamente uma, que não pode e não deve ser pronunciada. Parece-me que todo o resto não é proibido. Mas acontece que eu quero é exatamente me unir a essa palavra proibida. Ou será? Se eu encontrar essa palavra, só a direi em boca fechada, para mim mesma, senão corro o risco de virar alma perdida por toda a eternidade. Os que inventaram o Velho Testamento sabiam que existia uma fruta proibida. As palavras é que me impedem de dizer a verdade.
Simplesmente não há palavras."

"O que não sei dizer é mais importante do que o que eu digo. Acho que o som da música é imprescindível para o ser humano e que o uso da palavra falada e escrita são como a música, duas coisas das mais altas que nos elevam do reino dos macacos, do reino animal, e mineral e vegetal também. Sim, mas é a sorte às vezes.
Sempre quis atingir através da palavra alguma coisa que fosse ao mesmo tempo sem moeda e que fosse e transmitisse tranqüilidade ou simplesmente a verdade mais profunda existente no ser humano e nas coisas. Cada vez mais eu escrevo com menos palavras. Meu livro melhor acontecerá quando eu de todo não escrever. Eu tenho uma falta de assunto essencial. Todo homem tem sina obscura de pensamento que pode ser o de um crepúsculo e pode ser uma aurora.
Simplesmente as palavras do homem."

VERBUM – I

"A palavra é a minha quarta dimensão.
O que pintei nessa tela é passível de ser fraseado em palavras? Tanto quanto possa ser implícita a palavra muda no som musical.
E eis que percebo que quero para mim o substrato vibrante da palavra repetida em canto gregoriano.
Minhas desequilibradas palavras são o luxo do meu silêncio.
O que te falo nunca é o que te falo e sim outra coisa."

ÁSPERO OFÍCIO – I

"Ao escrever, não posso fabricar como na pintura, quando fabrico artesanalmente uma cor.
Escrevo por profundamente querer falar.
E se digo “eu” é porque não ouso dizer “tu”, ou “nós” ou “uma pessoa”. Sou obrigada à humildade de me personalizar me apequenando mas sou o és-tu.
Inútil querer me classificar: eu simplesmente escapulo não deixando, gênero não me pega mais.
Quero escrever-te como quem aprende."

Clarice Lispector

Sobre o amor e a beleza:

William-Adolphe_Bouguereau

“Quando alguém neste mundo vê a beleza e se recorda da Beleza verdadeira, recebe asas e deseja voar; não podendo, porém, volta seu olhar para o céu negligenciando os assuntos terrenos e dando desse modo a entender que está delirante. De todos os delírios, este é o melhor e da mais pura origem, saudável para quem o possui e dele participa. Quem delira assim, ama o que é belo e chama-se amante.”

Platão, diálogo "Fedro", 249 d-e

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Meditação da noite



Noites de lanças e estandarte azul,
Não vertes sobre a terra desconforme
O teu bálsamo antigo de sossego:
Vem antes o veneno da tua esfera.

Que destruições geraste no teu ventre
Enquanto os homens se velavam a face!
Templo de experiência e expiação,
O incenso da matéria se respira

Nas tuas arcadas nuas e rochosas.
Somos agora a raça clandestina
Que, noite hostil, ainda não pudeste

Das dobras dos teus panos remover:
Ululantes erramos pelo mundo,
Conduzindo nossa morte corporal.


Murilo Mendes, em "Antologia Poética", Rio de Janeiro: Editora Agir, 1964.

Plano de Voo

Kary - Kiera Malone

Cobrí aquele homem de um tesão incontrolável
depois me mandei, mudei de hotel
leviana como sempre
rasguei sem ler as cartas, eu não me importo
com o sofrimento de ninguém

Dias atrás passou por mim, fiz que não vi
uma preguiça de explicar a vida
difícil resumir.

Fui impulsiva e me afastei pra sempre
de sua cama.
- Temos nossas diferenças - eu lhe disse uma manhã.

Difícil se acostumar a conviver
com alguém que usa pijama
e fica olhando pra gente
com cara de galã.

Bruna Lombardi


"O destino dos animais é muito mais importante para mim do que o medo de parecer ridículo." - Émile Zola


"Quando o homem aprender a respeitar até o menor ser da criação, seja animal ou vegetal, ninguém precisará ensiná-lo a amar seu semelhante." - Albert Schwweitzer ( Nobel da Paz - 1952 )


"Atrocidades nao são atrocidades menores quando ocorrem em laboratórios, ou quando recebem o nome de 'pesquisa médica'." - George Bernard Shaw (Dramaturgo, Nobel 1925)


"Os animais são meus amigos...e eu não como meus amigos." - George Bernard Shaw ( Nobel - 1925 )


"Primeiro foi necessário civilizar o homem em relação ao próprio homem. Agora é necessário civilizar o homem em relação a natureza e aos animais." - Victor Hugo

domingo, 27 de dezembro de 2009

O Olvido




Na outra margem da noite
o amor é possível

leva-me

leva-me entre as doces substâncias
que morrem a cada dia em tua memória

ALEJANDRA PIZARNIK


en la otra orilla de la noche / el amor es posible // llévame // llévame entre las dulces sustancias / que mueren cada día en tu memoria

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Coisas de verão...


O sol desceu pelo escorregador e fez o mundo sorrir tão de repente,
que toda a gente parou para assistir.
Coisas de Verão ...
É o coração que fica adolescente, o corpo forte, de pé para aplaudir.



Flora Figueiredo

Se alguém me perguntar



Se alguém me perguntar, hei de dizer que sim, que foi
verdade que não amei ninguém depois de ti nem
o meu corpo procurou nunca mais outro incêndio
que não fosse a memória de um instante junto
do teu corpo; e que deixei de ler quando partiste
por não suportar as palavras maiores longe da tua boca;
e que tranquei os livros na despensa e tranquei a despensa,
acreditando que, se não me alimentasse, acabaria
por sofrer de uma doença menor do que a saudade, mas
a que os outros, pelo menos, não chamariam loucura.

Se alguém me perguntar, direi que foi assim, e não de
outra maneira, como alguns parecem supor - que permiti,
bem sei, que outros homens me amassem e me aquecessem
a cama, mas em troca lhes dei apenas um nome diferente
do que tinham e os vi partir desesperados a meio
da noite sem sentir maior dor que a de saber que, afinal,
também eles não existiam para além de ti; e que no dia
seguinte dava comigo a trautear sem querer essa canção
que amavas (como se ela, sim, se tivesse deitado
no meu ouvido), mas que a sua melodia, em vez
de me alegrar como antes, me escurecia mais a vida.

Se alguém me perguntar, nada desmentirei, nem negarei
que os frutos todos que me deram a provar na tua ausência
me pareceram demasiado azedos ao pé dos que explodiam
em sumo nos teus lábios; e que, por isso, nunca mais quis
um beijo de ninguém, nem sequer inocente, e não voltei
também a aceitar as flores que me traziam por me lembrar
que, em mãos assim, tão grandes para o afecto, o seu
perfume anunciava invariavelmente a chegada do outono.

E contarei por fim, se alguém quiser saber, que o teu silêncio
foi de tal densidade, de tal espessura, que não consegui
escutar nenhuma das vozes que vieram depois de ti e, pior
do que isso, me esqueci com indiferença das mais antigas,
pelo que as minhas noites se tornaram uma tão longa
e solitária travessia que ainda esta manhã acordei ao lado
da tua sombra e respondi baixinho, mesmo sem ninguém
me perguntar, que há coisas que uma mala nunca leva.

 Maria do Rosário Pedreira

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Card 2010

Aforismo 4 - O que conserva a espécie



Até hoje, foram os espíritos mais fortes e os espíritos mais malignos que obrigaram a humanidade a fazer mais progressos: inflamaram constantemente as paixões adormecidas – todas as sociedades policiadas as adormecem – eles despertaram constantemente o espírito de comparação e de contradição, o gosto pelo novo, pelo arriscado, pelo inexperimentado; obrigaram o homem a contrapor opiniões a opiniões, modelos a modelos. As mais das vezes pelas armas, derrubando os marcos fonteiriços, violando as crenças, mas também como novas religiões novas morais! A “maldade” que se encontra em todos os professores do novo, em todos os pregadores de coisas novas, é a mesma que desacredita o conquistador, se bem que ela se exprime com maior finura e não mobilize imediatamente o músculo – o que faz com que desacredite com menos força! – o novo, em todas as circunstâncias, é o mal, pois é aquilo que deseja conquistar, derrubar os marcos fronteiriços, abater as antigas crenças, somente o antigo é o bem! Os homens de bem em todas as épocas, são aqueles que implantam profundamente as velhas idéias para lhes dar fruto, são os cultivadores do espírito. Mas todo o terreno acaba por se esgotar, é preciso sempre que o arado do mal volte. Existe agora uma teoria da moral, uma doutrina fundamentalmente errada, que conhece uma grande vaga na Inglaterra: de acordo com ela, os juízos de “bem” e “mal” exprimem um total de experiências relativas ao que é “oportuno”, e ao que é “inoportuno”, que se chama “bem” ao que conserva a espécie, e “mal” àquilo que a prejudica. Todavia, os maus instintos são na realidade tão apropriados ao fim, tão úteis à conservação da espécie e tão indispensáveis quanto os bons: somente a sua função é diferente.

Friedrich Nietzsche in A Gaia Ciência

Não tenho nada a ver com explosões,

Licio Passon 

Também não faço muito barulho, ainda que seja no silêncio que nos arrebentamos. Tampouco tenho a ver com o espaço sideral, com galáxias ou mesmo com estrelas. Preciso estar firmemente pousada sobre algo - ou alguém. Abraços me seguram. E eu me agarro. Tenho medo da falta de gravidade: solta demais me perco, não voo senão em sonhos... Não tenho nada a ver com boate, com o som alto impedindo a voz, com a sensualidade comprada em shopping, com o ajuntamento que é pura distância, as horas mortas desgastando o rosto, a falsa alegria dos ausentes de si mesmos. Não tenho nada a ver com o que é dos outros, sejam roupas, gostos, opiniões ou irmãos, não me escalo para histórias que não são minhas, não me envolvo com o que não me envolve, não tomo emprestado nem me empresto. Se é caso sério eu me doo, se é bobagem eu me abstenho, tenho vida própria e suficiente pra lidar, sobra pouco de mim para intromissões no que me é ainda mais estranho do que eu mesma. Não tenho nada a ver com cenas de comerciais de TV, sou um filme sueco, uma comédia britânica, um erro de adaptação, um personagem que esquece a fala, nada possuo de floral ou carnaval, não aprendi a ser festiva, sou apenas fácil. ...Não tenho nada a ver com galáxia, mato, boate, a vida dos outros, os comerciais de TV e igrejas. Meu mundo se resume a palavras que me perfuram, a canções que me comovem, a paixões que já nem lembro, a perguntas sem respostas, a respostas que não me servem, à constante perseguição do que ainda não sei. Meu mundo se resume ao encontro do que é terra e fogo dentro de mim, onde não me enxergo, mas me sinto. Minto, tenho tudo a ver com explosões.


Martha Medeiros

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009


Para onde quer que voltes o olhar, ali está o fim de teus males. Vês aquele local escarpado? Por lá desce à liberdade. Vês aquele mar, aquele rio, aquele poço? A liberdade está assentada em seu fundo. Vês aquela árvore acanhada, ressequida, estéril? Pende dali a liberdade. Vês tua cerviz, teu pescoço, teu coração? São vias de escape da servidão. Mostro-te saídas por demais operosas e que exigem muita coragem e energia? Buscas qual seja o caminho para a liberdade? Qualquer veia em teu corpo.

Sêneca, “Sobre a Ira”


As borboletas são independentes. Não existe ciúme entre elas, nenhuma controla o voo da outra, não existe desenho prévio para o tipo de voo quando saem a passeio. Não fazem planos para o voo do dia seguinte, não acumulam nada nas costas, não se casam nem se prometem coisas absurdas. Por isso, as borboletas fascinam. Por isso as pessoas querem seguir as borboletas. Dançar com elas. Ser como elas.

Edson Marques

Declaração de amor



Esta é uma declaração de amor: amo a língua portuguesa. Ela não é fácil. Não é maleável. E, como não foi profundamente trabalhada pelo pensamento, a sua tendência é a de não ter sutileza e de reagir às vezes com um pontapé contra os que temerariamente ousam transformá-la numa linguagem de sentimento de alerteza. E de amor. A língua portuguesa é um verdadeiro desafio para quem escreve. Sobretudo para quem escreve tirando das coisas e das pessoas a primeira capa do superficialismo. Às vezes ela reage diante de um pensamento mais complicado. Às vezes assusta com o imprevisível de uma frase. Eu gosto de manejá-la - como gostava de estar montando num cavalo e guiá-lo pelas rédeas, às vezes lentamente, às vezes a galope. Eu queria que a língua portuguesa chegasse ao máximo nas minhas mãos. E este desejo todos os que escrevem têm.
Um Camões e outros iguais não bastaram para nos dar uma herança de língua já feita. Todos nós que escrevemos estamos fazendo do túmulo do pensamento alguma coisa que lhe dê vida. Essas dificuldades, nós as temos. Mas não falei do encantamento de lidar com uma língua que não foi aprofundada. O que recebi de herança não me chega. Se eu fosse muda, e também não pudesse escrever e me perguntassem a que língua eu queria pertencer, eu diria: inglês, que é preciso e belo. Mas como nasci muda e pude escrever, tornou-se absolutamente claro para mim que eu queria mesmo era escrever em português. Eu até queria não ter aprendido outras línguas: só para que minha abordagem do português fosse virgem e límpida.


Clarice Lispector

sábado, 19 de dezembro de 2009

Não creias nos meus retratos




Não creias nos meus retratos,
nenhum deles me revela,
ai, não me julgues assim!
Minha cara verdadeira
fugiu às penas do corpo,
ficou isenta da vida.
Toda minha faceirice e minha vaidade toda
estão na sonora face; naquela que não foi vista
e que paira, levitando,em meio a um mundo de cegos.
Os meus retratos são vários e neles não terás nunca
o meu rosto de poesia. Não olhes os meus retratos,
nem me suponhas em mim.


Gilka Machado

O meu amor não cabe num poema

Alain Dumas

O meu amor não cabe num poema - há coisas assim,
que não se rendem à geometria deste mundo;
são como corpos desencontrados da sua arquitectura
ou quartos que os gestos não preenchem.
O meu amor é maior que as palavras; e daí inútil
a agitação dos dedos na intimidade do texto-
a página não ilustra o zelo do farol que agasalha as baías
nem a candura da mão que protege a chama que estremece.
O meu amor não se deixa dizer- é um formigueiro
que acode aos lábios como a urgência de um beijo
ou a matéria efervescente dos segredos; a combustão
laboriosa que evoca, à flor da pele, vestígios
de uma explosão exemplar: a cratera que um corpo,
ao levantar-se, deixa para sempre na vizinhança de outro corpo.
O meu amor anda por dentro do silêncio a formular loucuras
com a nudez do teu nome - é um fantasma que estrebucha
no dédalo das veias e sangra quando o encerram em metáforas.

Um verso que o vestisse definharia sob a roupa
como o esqueleto de uma palavra morta.

Nenhum poema podia ser o chão da sua casa.


Maria do Rosário Pedreira

T.S. Eliot

T. S. Eliot at 13 reading Shakespeare by his sister Charlotte Eliot.

Natal sem dor e morte

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Se não falas, vou encher o meu coração




Se não falas, vou encher o meu coração
Com o teu silêncio, e agüentá-lo.
Ficarei quieto, esperando, como a noite
Em sua vigília estrelada,
Com a cabeça pacientemente inclinada.
A manhã certamente virá,
A escuridão se dissipará, e a tua voz
Se derramará em torrentes douradas por todo o céu.
Então as tuas palavras voarão
Em canções de cada ninho dos meus pássaros,
E as tuas melodias brotarão
Em flores por todos os recantos da minha floresta.


Tagore

Simplesmente Amor




Amor é a coisa mais alegre
Amor é a coisa mais triste
Amor é a coisa que mais quero
Por causa dele falo palavras como lanças

Amor é a coisa mais alegre
Amor é a coisa mais triste
Amor é a coisa que mais quero
Por causa dele podem entalhar-me:
Sou de pedra sabão.

Alegre ou triste
Amor é a coisa que mais quero.


Adélia Prado

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Danka Weitzen


Faz tempo que para pensar sobre Deus não leio os teólogos, leio os poetas.


Rubem Alves 


Ênigme - Alfred Agache

Inventar fábulas sobre um ‘outro’ mundo diferente deste não tem sentido a não ser que domine em nós um instinto de calúnia, de depreciação, de receio: neste caso nos vingamos da vida com a fatasmagoria de ‘outra’ vida distinta desta e melhor do que esta”

Friedrich Nietzsche, Crepúsculo dos Ídolos




A miséria da minha condição não é estorvada por estas palavras conjugadas, com que formo, pouco a pouco, o meu livro casual e meditado. Subsisto nulo no fundo de toda a expressão, como um pó indissolúvel no fundo do copo de onde se bebeu só água. Escrevo a minha literatura como escrevo os meus lançamentos — com cuidado e indiferença. Ante o vasto céu estrelado e o enigma de muitas almas, a noite do abismo incógnito e o choro de nada se compreender — ante tudo isto o que escrevo no caixa auxiliar e o que escrevo neste papel da alma são coisas igualmente restritas à Rua dos Douradores, muito pouco aos grandes espaços milionários do universo.

Tudo isto é sonho e fantasmagoria, e pouco vale que o sonho seja lançamentos como prosa de bom porte. Que serve sonhar com princesas, mais que sonhar com a porta da entrada do escritório? Tudo que sabemos é uma impressão nossa, e tudo que somos é uma impressão alheia, melodrama de nós, que, sentindo-nos, nos constituímos nossos próprios espectadores ativos, nossos deuses por licença da Câmara.

Bernardo Soares (Fernando Pessoa)
O livro do desassossego

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Ennio Montariello 


“Certamente há outro mundo, mas ele se encontra neste aqui.”

(Il y a assurément un autre monde, mais il est dans celui-ci.)


, Paul ÉLUARD, Oeuvres complètes.


Giorgio Dante 

“L'homme est libre au moment qu'il veut l'être”

Voltaire, "Brutus" (Act II, scene I)

Quando Olho para Mim não Me Percebo



Quando olho para mim não me percebo.
Tenho tanto a mania de sentir
Que me extravio às vezes ao sair
Das próprias sensações que eu recebo.

O ar que respiro, este licor que bebo,
Pertencem ao meu modo de existir,
E eu nunca sei como hei de concluir
As sensações que a meu pesar concebo.

Nem nunca, propriamente reparei,
Se na verdade sinto o que sinto. Eu
Serei tal qual pareço em mim? Serei

Tal qual me julgo verdadeiramente?
Mesmo ante as sensações sou um pouco ateu,
Nem sei bem se sou eu quem em mim sente.


Álvaro de Campos, in "Poemas"

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Desejo


Desejo dizer-lhe as palavras mais profundas, mas não me atrevo, porque temo sua gozação. Por isso acho graça de mim mesmo e transformo em brincadeira meu segredo.
Duvido de minha angústia, para que você não duvide.
Desejo dizer-lhe as palavras mais sinceras, mas não me atrevo, porque temo que não acredite. Por isso as disfarço de mentiras e digo o contrário do que penso.
Me esforço para que minha angústia não pareça absurda para que você não ache que é.
Desejo dizer-lhe as palavras mais valiosas, mas não me atrevo, porque temo não ser correspondido. Por isso me declaro duramente e me orgulho de minha insensibilidade.
Desejo sentar-me silenciosamente a seu lado, mas não me atrevo, porque temo que meus lábios traiam meu coração. Por isso falo disparatadamente, escondendo meu coração atrás das minhas palavras.
Trato a mim mesmo com dureza, para que você não o faça.
Desejo separar-me de você, mas não me atrevo, porque temo que descubra minha covardia. Por isso levanto a cabeça e fico perto de você com ar indiferente.
A constante provocação de nossos olhares remove minha angústia sem piedade.



Rabindranat Tagore

Aldous Huxley, Satânicos e Visionários


“Puerilidade [...] é odiar a realidade porque ela não se parece com os contos de fada que os homens tem inventado para consolar a si próprios pelos dissabores e dificuldades da vida diária. Ou odiá-la porque a vida aparentemente não tem a importância que um autor consagrado achou de lhe atribuir. [...] mas o objetivo da vida, além de mera continuidade do viver (de si mesmo um fim belo e notabilíssimo), é o objetivo que nós mesmos lhe damos: seu significado é qualquer um que calhemos de chamar como tal. A vida não é um jogo de palavras cruzadas, com sua resposta previamente estabelecida e um prêmio para o ingênuo que nelas esfregue seu nariz. O enigma do universo tem tantas soluções quantos são seus habitantes vivos. Cada resposta é uma hipótese operante, segundo os termos que o respondedor trava com a realidade. As melhores respostas são aquelas que permitem ao respondedor viver na plenitude, enquanto que as piores são aquelas que o condenam à morte parcial ou completa.”

Aldous Huxley, Satânicos e Visionários

Terror de te Amar

Gianni Bellini



Terror de te amar num sítio tão frágil como o mundo.


Mal de te amar neste lugar de imperfeição
Onde tudo nos quebra e emudece
Onde tudo nos mente e nos separa.


Sophia de Mello Breyner Andresen

domingo, 13 de dezembro de 2009



Todas as cartas de amor são

Ridículas.

Não seriam cartas de amor se não fossem

Ridículas.

Também escrevi em meu tempo cartas de amor,

Como as outras,

Ridículas.

As cartas de amor, se há amor,

Têm de ser

Ridículas.

Mas, afinal,

Só as criaturas que nunca escreveram

Cartas de amor

É que são

Ridículas.

Quem me dera no tempo em que escrevia

Sem dar por isso

Cartas de amor

Ridículas.

A verdade é que hoje

As minhas memórias

Dessas cartas de amor

É que são

Ridículas.

(Todas as palavras esdrúxulas,

Como os sentimentos esdrúxulos,

São naturalmente

Ridículas.)



Álvaro de Campos (heterônimo de Fernando Pessoa)
Michael & Inessa Garmash


Sit in reverie and watch the changing color of the waves that break upon the idle seashore of the mind.

Henry Wadsworth Longfellow


No lençol do campo, o corpo procura

a terra macia que renasce da memória

insone. Não ouve os pássaros, nem

se oferece a um sol proscrito do seu

rosto. Morde a maçã do instante

no ofício do desejo, matando a sede

que lhe secou os lábios. E o dia sobe

nos seus dedos, como o barro, para

que deles surja a figura do amor.


Nuno Júdice

sábado, 12 de dezembro de 2009

A formalística

R. Masson Benoit 


O poeta cerebral tomou café sem açúcar
e foi pro gabinete concentrar-se.
Seu lápis é um bisturi
que ele afia na pedra,
na pedra calcinada das palavras,
imagem que elegeu porque ama a dificuldade,
o efeito respeitoso que produz
seu trato com o dicionário.
Faz três horas já que estuma as musas.
O dia arde. Seu prepúcio coça.
Daqui a pouco começam a fosforecer coisas no mato.
A serva de Deus sai de sua cela à noite
e caminha na estrada,
passeia porque Deus quis passear
e ela caminha.
O jovem poeta,
fedendo a suicídio e glória,
rouba de todos nós e nem assina:
'Deus é impecável'.
As rãs pulam sobressaltadas
e o pelejador não entende,
quer escrever as coisas com as palavras.

Adélia Prado



“Vós outros andais muito solícitos em redor do próximo, e manifestai-o com belas palavras. Mas eu vos digo: o vosso amor ao próximo é vosso meu amor a vós mesmos.

Fugis de vós em busca do próximo, e quereis converter isso numa virtude; mas eu compreendo o vosso “desinteresse”.

O Tu é mais velho do que Eu; o Tu acha-se santificado, mas o Eu ainda não. Por isso o homem anda diligente atrás do próximo.

Acaso vos aconselho o amor ao próximo? Antes vos aconselho a fuga do “próximo” e o amor ao remoto!

Mais elevado que o amor ao próximo é o amor ao longínquo, ao que está por vir, mais alto ainda que o amor ao homem coloco o amor às coisas e aos fantasmas.

Esse fantasma que corre diante de vós, meus irmãos, é mais belo que vós. Por que lhe não dais a vossa carne e os vossos ossos? Mas tende-lhes medo e fugis à procura do vosso próximo.

Não vos suportais a vós mesmos e não vos quereis bastante; desejaríeis seduzir o próximo por vosso amor e dourar-vos com a sua ilusão.

Quisera que todos esses próximos e seus vizinhos se vos tornassem insuportáveis; assim teríeis que criar para vós mesmos o vosso amigo e o seu coração fervoroso.

Chamais uma testemunha quando quereis falar bem de vós, e logo que a haveis induzido a pensar bem da vossa pessoa, vós mesmos pensais bem da vossa pessoa.

Não só mente o que fala contra a sua consciência, mas sobretudo o que fala com a sua inconsciência. E assim falais de vós no trato social, enganando o vizinho.

Fala o louco: “O trato com os homens exaspera o caráter, principalmente quando o não temos”.

Um vai após o próximo, porque se procura; o outro porque se quisera esquecer.

A vossa malquerença com respeito a vós mesmos converte a vossa soledade num cativeiro.

Os mais afastados são os que pagam o nosso amor ao próximo, e quando vós juntais cinco, deve morrer um sexto.

Também me não agradam as vossas festas; encontrei nelas demasiados cômicos e os mesmos espectadores se conduzem frequentemente como cômicos.

Não falo do próximo; falo só do amigo. Seja o amigo para vós a festa da terra e um pressentimento do Super-homem.

Falo-vos do amigo e do seu coração exuberante. Mas é preciso saber ser uma esponja quando se quer ser amado por corações exuberantes.

Falo-vos do amigo que leva em si um mundo disponível, um envólucro do bem — do amigo criador que tem sempre um mundo disponível para dar.

E como se desenvolveu o mundo para ele, assim se envolve de novo: tal é o advento do bem pelo mal, do desígnio pelo acaso.

Sejam o porvir e o mais remoto a causa do vosso hoje; no vosso amigo deveis amar o Super-homem, como razão de ser.

Meus irmãos, eu não vos aconselho o amor ao próximo; aconselho-vos o amor ao mais afastado”.

Assim falava Zaratustra.


Friedrich Nietzsche, Assim falava Zaratustra

Liberdade...

Gustavo Dominguez

A liberdade é a possibilidade do isolamento. És livre se podes afastar-te dos homens, sem que te obrigue a procurá-los a necessidade de dinheiro, ou a necessidade gregária, ou o amor, ou a glória, ou a curiosidade, que no silêncio e na solidão não podem ter alimento. Se te é impossível viver só, nasceste escravo. Podes ter todas as grandezas do espírito, todas da alma: és um escravo nobre, ou um servo inteligente: não és livre. E não está contigo a tragédia, porque a tragédia de nasceres assim não é contigo, mas do Destino para si somente. Ai de ti, porém, se a opressão da vida, ela própria, te força a seres escravo. Ai de ti se, tendo nascido liberto, capaz de te bastares e de te separares, a penúria te força a conviveres. Essa, sim, é a tua tragédia, e a que trazes contigo.

Nascer liberto é a maior grandeza do homem, o que faz o ermitão humilde superior aos reis, e aos deuses mesmo, que se bastam pela força, mas não pelo desprezo dela.

A morte é uma libertação porque morrer é não precisar de outrem. O pobre escravo vê-se livre à força dos seus prazeres, das suas mágoas, da sua vida desejada e contínua. Vê-se livre o rei dos seus domínios, que não queria deixar. As que espalharam amor vêem-se livres dos triunfos que adoram. Os que venceram vêem-se livres das vitórias para que a sua vida se fadou.

Por isso a morte enobrece, veste de galas desconhecidas o pobre corpo absurdo. É que ali está um liberto, embora o não quisesse ser. É que ali não está um escravo, embora ele chorando perdesse a servidão. Como um rei cuja maior pompa é o seu nome de rei, e que pode ser risível como homem, mas como rei é superior, assim o morto pode ser disforme, mas é superior, porque a morte o libertou.

Fecho, cansado, as portas das minhas janelas, excluo o mundo e um momento tenho a liberdade. Amanhã voltarei a ser escravo; porém agora, só, sem necessidade de ninguém, receoso apenas que alguma voz ou presença venha interromper-me, tenho a minha pequena liberdade, os meus momentos de excelsis.

Na cadeira, aonde me recosto, esqueço a vida que me oprime. Não me dói senão ter-me doído.


Livro do Desassossego por Bernardo Soares. Vol.II. Fernando Pessoa. (Recolha e transcrição dos textos de Maria Aliete Galhoz e Teresa Sobral Cunha. Prefácio e Organização de Jacinto do Prado Coelho.) Lisboa: Ática, 1982. 

Poesia...

Carolina Serpa Marques 

"Mas o que vou dizer da Poesia?
O que vou dizer destas nuvens, deste céu?
Olhar, olhar, olhá- las, olhá-lo, e nada mais.
Compreenderás que um poeta não pode dizer nada da poesia.
Isso fica para os críticos e professores.
Mas nem tu, nem eu, nem poeta algum sabemos o que é a poesia."


Federico Garcia Lorca

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009



Basta pensar em sentir 
Para sentir em pensar. 
Meu coração faz sorrir 
Meu coração a chorar. 
Depois de parar de andar, 
Depois de ficar e ir, 
Hei de ser quem vai chegar 
Para ser quem quer partir. 

Viver é não conseguir.  


Fernando Pessoa

Fim de Festa


Sou uma mulher desmontada
volto pra casa
depois de prender o salto do sapato no bueiro
me olho no espelho do banheiro
acendo a luz
hálito de rum, a boca meio borrada
minha cara não me traduz
debaixo do chuveiro
escrevo a peça mais interessante do momento
descubro a cura do câncer
o raio x de longo alcance
sei os segredos de alcova do governo, sou
um elemento de alta periculosidade
mas na verdade, sou uma mistura dos cheiros da festa

foda-se se ele me detesta
falo sozinha enquanto canto
"sei que eu sou bonita e gostosa"
e passo babosa nos cabelos, o dedo devagar
entre os pêlos, pra relaxar
e sobe um calor vermelho
em frente ao espelho entrevistas aos jornais da cidade
todas as revistas, a última novidade sou eu.
Declaro coisas inimagináveis
sou discutida nos bares, consumida
uma vida inteira dedicada à ciência
sou a maior competência em raio laser
a primeira astronauta mulher

foda-se que ele me despreze
"ele é quem quer, ele é o homem, eu sou apenas ..."
canto distraída
o herói da noite duvida que eu seja capaz
Sou muito mais. Sei tudo de política, economia,
planos, estratégias, grafítica, sodomia e tudo mais.
Sou eu que declaro as guerras do ocidente
entendo de mitologias astrologias e coisas
muito menos consequentes
declaro inteligentemente que o amor é um estado
de espírito, de sítio, um misto quente
tenho um conhecimento empírico
e vou adiante

gosto de escândalos
ele que se aguente
eu o odeio. passo o dedo na ponta do seio
ele que me telefone agora de repente

Bruna Lombardi

Fala mais alto. Poucas coisas te peço e tão pequenas. Tens a faca, abre já te disse. Usa esse de nove miligramas, esse que acaba com o todo. Alguma coisa deves renunciar, luta comigo. Tenta. Quem sabe se  me enganas, falas do teu esforço, mas não estás deitado? Usa a linguagem fundamental, usa o esteio, o formão sobre o cobre, usa o teu sangue, estás me ouvindo? Isso é matéria moldável, não é nada, estás subindo acima do que entendo, te espraias, estás me comprimindo, onde é que tens a cabeça? Sou teu nervo. Com ele, toco o infinito. Não sei da garganta. Fica ao redor de ti? Apenas canta? Me louva? Então come de mim, me comendo me sabes. Não medita. Suga. Vai até a seiva, até a sutileza. Pesas como palha, não te escuto. Abre um caminho, abre outro, tenta, eu disse seiva sim, eu disse suga sim, eu disse come de mim. Ainda me escutas? Disseste PALAVRA? Cada vez mais, menos te entendo, agora flutuas. Te aborreces, se eu digo que em mim, tens o peso da pluma? Ainda me lembro: pluma, peso, saíram da minha fronte, resguardei-os do medo, queriam subir, entendia SUBIDA, dei-lhes o meio, construção mais rara, agora tu dizes que alguns se devoram? Comem de si mesmos? Se são iguais devem afastar-se, devem procurar aqueles do outro lado, conviver com o que tu chamas AMARGO, APARÊNCIA.


Hilda Hilst

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Karatê - (Kata)


Vimos de mãos vazias. Não temos armas.
Mas se formos obrigados a defender os nossos princípios e a nossa honra,
Se é uma questão de justiça ou de injustiça,
Então aqui estão as nossas armas: AS NOSSAS MÃOS VAZIAS.

KATA

O Kata é por definição, um combate com um adversário imaginário. Mas, na verdade é muito mais que uma simples definição. O Kata pode ser considerado a alma de um treino de Karaté.

Esquema ou diagrama

É a memorização dos movimentos do Kata. Com suas direções, golpes aplicados, movimentações de cabeça e olhares. Para que isso ocorra é preciso que seja feita uma memorização de todos os movimentos executados no kata. Dessa forma o corpo responde quase que instintivamente aos movimentos, sem que seja necessário parar para pensar no que vem a seguir.

Respiração

A Respiração é um ponto muito importante para o desempenho de um bom kata. Com isso pode-se dosar o esforço e energia gasta em cada movimento. Através desse recurso é possível aumentar força e a velocidade além de ajudar na concentração e ainda ressaltar pontos importantes do kata, como aqueles acompanhados de kiai.

Tempo

Para que se faça a sequência de movimentos do kata, é necessário obedecer a um tempo de execução de cada movimento. O objetivo dessa sequência diferenciada, é exatamente a simulação de uma luta, onde diferentes movimentos são representados em tempos e situações diferentes.

Kime

O kime, que é a junção de força e velocidade tem como objetivo dar "vida" ao kata, demonstrando movimentos firmes, rápidos e com definição.




Poente



Compreende-se tudo,
de repente:
São oito séculos a ver o Sol morrer
afogado no mar,
diariamente.

José Fernandes Fafe

Animais. Ame-os!


"Olhe no fundo dos olhos de um animal e, por um momento, troque de lugar com ele. A vida dele se tornará tão preciosa quanto a sua e você se tornará tão vulnerável quanto ele. Agora sorria, se você acredita que todos os animais merecem nosso respeito e nossa proteção, pois em determinado ponto eles são nós e nós somos eles."

Philip Ochoa

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Encontro




Procuro os que sabem de mim.
Os que disseram ter me ouvido falar.
Os que me encontram, quando me perco.


Em quantos poemas estou presente?
Em qual deles era verdade?


Perco-me um pouco todo dia,
para me encontrar em tantos outros.
Não revelo, nem disfarço.
Apenas passo.
Mas há momentos em que me demoro.


Celso Brito

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Pudesse eu morrer hoje como tu me morreste nessa noite



Pudesse eu morrer hoje como tu me morreste nessa noite-

e deitar-me na terra; e ter uma cama de pedra branca e
um cobertor de estrelas; e não ouvir senão o rumor das ervas
que despontam de noite, e os passos diminutos de insectos,
e o canto do vento nos ciprestes, e não ter medo das sombras,
nem das aves negras nos meus braços de mármore,
nem de ter perdido - não ter medo de nada. Pudesse

eu fechar os olhos neste instante e esquecer-me de tudo-
das tuas mãos tão frias quando estendi as minhas nessa noite,
de não teres dito a única palavra que me faria salvar-te, mesmo
deixando que eu perguntasse tudo; de teres insultado a vida
e chamado pela morte para me mostrares que o teu corpo
já tinha desistido, que ias matar-te em mim e que era tarde
para eu pensar em devolver-te os dias que roubara. Pudesse

eu cair num sono gelado como o teu e deixar de sentir a dor,
a dor incomparável de te ver acordado em tudo o que escrevi-
porque foi pelo poema que me amaste, o poema foi sempre
o que valeu a pena ( o mais eram os gestos que não cabiam
nas mãos, os morangos a que o verão obrigou); e pudesse

eu deixar de escrecer nesta manhã, o dia treme na linha
dos telhados, a vida hesita tanto, e pudesse eu morrer,
mas ouço-te a respirar no meu poema.

Maria do Rosário Pedreira

Albert Einstein


" Grandes almas sempre encontraram forte oposição de mentes medíocres."

Albert Einstein

Noturno



Pelo amor de Deus, só me abandone de noite.
Se quiser viajar sem mim, se ficar louca por outra pessoa
Ou até se quiser visitar sua família e não me levar,
vai de noite.
Nunca, mas nunca mesmo, me deixe de dia.
Não vá me expor aos camelôs gritando, ao sol a pino, à modernidade clara.
Fique comigo mesmo sem querer, só até às seis da tarde.
Não me deixe sozinho com mulheres histéricas no supermercado, os senadores atrasados, as lanchonetes rapidinhas.
Agora, de noite pode ir.
Eu e os meus fantasmas, apesar de saudosos,
sobreviveremos à sua falta
Noturnos.
Assim seja.


Oswaldo Montenegro