sábado, 28 de fevereiro de 2009

A Máquina do Mundo

Obra: Il Quarto Stato (1901) Giuseppe Pellizza da Volpedo (1868-1907).

E como eu palmilhasse vagamente
uma estrada de Minas, pedregosa,
e no fecho da tarde um sino rouco

se misturasse ao som de meus sapatos
que era pausado e seco; e aves pairassem
no céu de chumbo, e suas formas pretas

lentamente se fossem diluindo
na escuridão maior, vinda dos montes
e de meu próprio ser desenganado,

a máquina do mundo se entreabriu
para quem de a romper já se esquivava
e só de o ter pensado se carpia.

Abriu-se majestosa e circunspecta,
sem emitir um som que fosse impuro
nem um clarão maior que o tolerável

pelas pupilas gastas na inspeção
contínua e dolorosa do deserto,
e pela mente exausta de mentar

toda uma realidade que transcende
a própria imagem sua debuxada
no rosto do mistério, nos abismos.

Abriu-se em calma pura, e convidando
quantos sentidos e intuições restavam
a quem de os ter usado os já perdera

e nem desejaria recobrá-los,
se em vão e para sempre repetimos
os mesmos sem roteiro tristes périplos,

convidando-os a todos, em coorte,
a se aplicarem sobre o pasto inédito
da natureza mítica das coisas,

assim me disse, embora voz alguma
ou sopro ou eco ou simples percussão
atestasse que alguém, sobre a montanha,

a outro alguém, noturno e miserável,
em colóquio se estava dirigindo:
“O que procuraste em ti ou fora de

teu ser restrito e nunca se mostrou,
mesmo afetando dar-se ou se rendendo,
e a cada instante mais se retraindo,

olha, repara, ausculta: essa riqueza
sobrante a toda pérola, essa ciência
sublime e formidável, mas hermética,

essa total explicação da vida,
esse nexo primeiro e singular,
que nem concebes mais, pois tão esquivo

se revelou ante a pesquisa ardente
em que te consumiste… vê, contempla,
abre teu peito para agasalhá-lo.”

As mais soberbas pontes e edifícios,
o que nas oficinas se elabora,
o que pensado foi e logo atinge

distância superior ao pensamento,
os recursos da terra dominados,
e as paixões e os impulsos e os tormentos

e tudo que define o ser terrestre
ou se prolonga até nos animais
e chega às plantas para se embeber

no sono rancoroso dos minérios,
dá volta ao mundo e torna a se engolfar
na estranha ordem geométrica de tudo,

e o absurdo original e seus enigmas,
suas verdades altas mais que tantos
monumentos erguidos à verdade;

e a memória dos deuses, e o solene
sentimento de morte, que floresce
no caule da existência mais gloriosa,

tudo se apresentou nesse relance
e me chamou para seu reino augusto,
afinal submetido à vista humana.

Mas, como eu relutasse em responder
a tal apelo assim maravilhoso,
pois a fé se abrandara, e mesmo o anseio,

a esperança mais mínima — esse anelo
de ver desvanecida a treva espessa
que entre os raios do sol inda se filtra;

como defuntas crenças convocadas
presto e fremente não se produzissem
a de novo tingir a neutra face

que vou pelos caminhos demonstrando,
e como se outro ser, não mais aquele
habitante de mim há tantos anos,

passasse a comandar minha vontade
que, já de si volúvel, se cerrava
semelhante a essas flores reticentes

em si mesmas abertas e fechadas;
como se um dom tardio já não fora
apetecível, antes despiciendo,

baixei os olhos, incurioso, lasso,
desdenhando colher a coisa oferta
que se abria gratuita a meu engenho.

A treva mais estrita já pousara
sobre a estrada de Minas, pedregosa,
e a máquina do mundo, repelida,

se foi miudamente recompondo,
enquanto eu, avaliando o que perdera,
seguia vagaroso, de mão pensas.


Carlos Drummond de Andrade 

Por favor, não me empurre de volta ao sem volta de mim.

Que não me doa hoje o existir dos outros, que não me doa hoje pensar nessa coisa puída de todos os dias, que não me comovam os olhos alheios e a infinita pobreza dos gestos com que cada um tenta salvar o outro deste barco furado. Que eu mergulhe no roxo deste vazio de amor de hoje e sempre e suporte o sol das cinco horas posteriores, e posteriores, e posteriores ainda.

(...) mas se por amor confundes e libertas o caos de tudo e de todos, por amor eu tento tocar mais fundo, procurando um voo que não conseguiria jamais num amor menor.

Agora apenas deslizo, sem excessivas aflições de ser feliz.

Acho que sou bastante forte para sair de todas as situações em que entrei, embora tenha sido suficientemente fraco para entrar.

Sempre há alguma coisa que falta. Guarde isso sem dor. Embora, em segredo, doa.

… tenho uma coisa apertada aqui no meu peito, um sufoco, uma sede, um peso, não me venha com essas história de atraiçoamos-todos-os-nossos-ideais, nunca tive porra de ideal nenhum, só queria era salvar a minha, veja só que coisa mais individualista elitista, capitalista, só queria ser feliz, cara.

Eu tinha qualquer coisa como andar de costas, quando todos andam de frente. Qualquer coisa como gritar, quando todos calam. Qualquer coisa que ofendia os outros, que não era a mesma deles e fazia com que me olhassem vermelhos, os dentes rasgando as coisas, eu doía neles como se fosse ácido, espinho, caco de vidro.

As pessoas falam coisas, e por trás do que falam há o que sentem, e por trás do que sentem, há o que são e nem sempre se mostra...

Tenho pensado se não guardarei indisfarçáveis remendos das muitas quedas, dos muitos tombos - embora sempre os tenha evitado. Aprendi que minhas delicadezas nem sempre são suficientes para despertar a suavidade alheia. E mesmo assim, ainda insisto.

O que eles deixaram foram três postulados: importante é a luz, mesmo quando consome; a cinza é mais digna que a matéria intacta e a salvação pertence apenas àqueles que aceitaram a loucura escorrendo em suas veias.

Ninguém te ensinará os caminhos. Ninguém me ensinará os caminhos. Ninguém nunca me ensinou caminho nenhum, nem a você, suspeito. Avanço às cegas. Não há caminhos a serem ensinados, nem aprendidos. Na verdade, não há caminhos...

Ai como eu queria tanto agora ter uma alma portuguesa para te aconchegar ao meu seio e te poupar essas futuras dores dilaceradas. Como queria tanto saber poder te avisar: vai pelo caminho da esquerda, boy, que pelo da direita tem lobo mau e solidão medonha.

Te desejo uma fé enorme, em qualquer coisa, não importa o quê, como aquela fé que a gente teve um dia, me deseja também uma coisa bem bonita, uma coisa qualquer maravilhosa, que me faça acreditar em tudo de novo, que nos faça acreditar em tudo outra vez.

Eu quis tanto ser a tua paz, quis tanto que você fosse o meu encontro. Quis tanto dar, tanto receber. Quis precisar, sem exigências. E sem solicitações, aceitar o que me era dado. Sem ir além, compreende? Não queria pedir mais do que você tinha, assim como eu não daria mais do que dispunha, por limitação humana. Mas o que tinha, era seu. A noite ultrapassou a si mesma, encontrou a madrugada, se desfez em manhã, em dia claro, em tarde verde, em anoitecer e em noite outra vez. Fiquei. Você sabe que eu fiquei. E que ficaria até o fim, até o fundo. Que aceitei a queda, que aceitei a morte. Que nessa aceitação, caí. Que nessa queda, morri. Tenho me carregado tão perdido e pesado pelos dias afora. E ninguém vê que estou morto.

Choro sempre quando os dias terminam porque sei que não nos procuraremos pelas noites, quando o meu perigo aumenta e sem me conter te assaltaria feito um vampiro faminto para te sangrar enquanto meus dentes penetrando nas veias de tua garganta arrancassem do fundo essa vida que me negas delicadamente, de cada vez que me procuras e me tomas, contudo me enveneno mais quando não vens e ninguém então me sabe parado feito velho num resto de sol de agosto, escurecido pela tua ausência...

Fico pensando se viver não será sinônimo de perguntar. A gente se debate, busca, segura o fato com duas mãos sedentas e pensa: "Achei! Achei!", mas ele escorrega, se espatifa em mil pedaços, como um vaso de barro coberto apenas por uma leve camada de louça. A gente fica só, outra vez, e tem que começar do nada, correndo loucamente em busca dos outros vasos que vê. Cada um que surge parece o último. Mas todos são de barro, quebram-se antes que possamos reformular as perguntas. E começamos de novo, mais uma vez, dia após dia, ano após ano. Um dia a gente chega na frente do espelho e descobre: "Envelheci." Então a busca termina. As perguntas calam no fundo da garganta, e vem a morte. Que talvez seja a grande resposta. A única.

Não sei como me defender dessa ternura que cresce escondida e, de repente, salta para fora de mim, querendo atingir todo mundo. Tão inesperada quanto a vontade de ferir, e com o mesmo ímpeto, a mesma densidade. Mas é mais frustrante. Sempre encontro a quem magoar com uma palavra ou um gesto. Mas nunca alguém que eu possa acariciar os cabelos, apertar a mão ou deitar a cabeça no ombro. Sempre o mesmo círculo vicioso : da solidão nasce a ternura, da ternura frustrada a agressão, e da agressividade torna a surgir a solidão. Todos os dias o ciclo se repete, às vezes com mais rapidez, outras mais lentamente. E eu me pergunto se viver não será essa espécie de ciranda de sentimentos que se sucedem e se sucedem e deixam sempre sede no fim.


Caio Fernando Abreu

Olhe nos olhos


Um documentário que trata da destruição dos ecossistemas, em particular o Cerrado e a Amazônia, pela agricultura industrial e pela pecuária, bem como os impactos dos alimentos industrializados na nossa saúde. O filme conta com o depoimento de vários especialistas nas áreas de meio ambiente, medicina e nutrição. Por fim, propõe repensar o conceito de alimentação e uma nova concepção holística de produção alimentar, através da alimentação natural e da agroecologia. Olhe nos Olhos é apenas um caminho para um mundo que exige uma nova consciência.

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Eu vi a floresta que você queimou



A natureza vê o homem destruir mas não pode fazer nada.



“A paixão quer que tudo seja eterno, mas a natureza impõe que tudo acabe.”

Denis Diderot

Dos pregadores da morte


“Há pregadores da morte, e a terra está cheia de indivíduos a quem é preciso pregar que desapareçam da vida.

A terra está cheia de supérfluos, e os que estão demais prejudicam a vida. Tirem-nos desta com o engodo da “eterna”!

“Amarelos” se costuma chamar aos pregadores da morte, ou então “pretos”. Eu, porém, quero apresentá-los também sob outras cores.

Terríveis são os que têm dentro de si a terra, e que só podem escolher entre as concupiscências e as mortificações.

Nem sequer chegariam a ser homens esses seres terríveis.

Preguem, pois, o abandono da vida, e vão-se eles também!

Eis os tísicos da alma. Mal nasceram e já conteçaram a morrer, e sonham com as doutrinas do cansaço e da renúncia.

Quereriam estar mortos, e nós devemos santificar-lhes a vontade. Livremo-nos de ressuscitar esses mortos e de lhes violar as sepulturas.

Encontram um doente, um velho ou um cadáver, e depois dizem: “Reprove-se a vida!”

Os reprovados, contudo, são eles unicamente, assim como os seus olhos que só vêem um aspecto da sua existência.

Sumidos na densa melancolia e ávidos dos leves acidentes que matam, esperam cerrando os dentes.

Ou então estendem a mão para doces e zombam das suas próprias criancices: estão encostados à vida como uma palha, e escarnecem de se apoiarem a uma palha.

A sua sabedoria diz: “Louco é aquele que pertence à vida, mas, assim somos nós loucos! E esta é a maior loucura da vida!”

“A vida não é mais do que sofrimento”, dizem outros, e não mentem.

Tratai pois de abreviar a vossa. Fazei cessar a vida que é só sofrimento!

Eis o ensinamento da vossa virtude: “Deves matar-te a ti mesmo! Deves desaparecer diante de ti mesmo!”

“A luxúria é pecado — dizem alguns dos que pregam a morte. — Separemo-nos e não engendremos filhos!”

“É doloroso dar à luz — dizem os outros. — Para que se há de continuar a dar à luz?” E também eles são pregadores da morte.

“É preciso ser compassivo — dizem os terceiros — Recebei o que tenho. Recebei o que sou! Assim me prendo menos à vida”.

Se fossem verdadeiramente compassivos procurariam desgostar da vida o próximo. Serem maus, seria a verdadeira bondade.

Eles, porém, querem libertar-se da vida. Que lhes importa prender outros a ela mais estreitamente com as suas cadeias e as suas dádivas?

E vós outros também, vós que levais uma vida de inquietação e de trabalho furioso, não estais cansadíssimos da vida? Não estais bastante sazonados para a pregação da morte?

Vós todos que amais o trabalho furioso e tudo o que é rápido, novo, singular, suportai-vos mal a vós mesmos: a vossa atividade é fuga e desejo de vos esquecerdes de vós mesmos.

Se tivésseis mais fé na vida, não vos entregaríeis tanto ao momento corrente; mas não tendes fundo suficiente para esperar nem tão pouco para a preguiça.

Por toda parte ressoa a voz dos que pregam a morte, e a terra está cheia de seres a que é mister pregar a morte.

Ou “a vida eterna” — que para mim é o mesmo — contanto que se vão depressa”.


Friedrich Nietzsche, Assim falou Zaratustra


quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Os votos


Pois desejo primeiro que você ame e que amando, seja também amado.
E que se não o for, seja breve em esquecer e esquecendo não guarde mágoa.
Desejo depois que não seja só, mas que se for, saiba ser sem desesperar.
Desejo também que tenha amigos e que mesmo maus e inconseqüentes sejam corajosos e fiéis.
E que em pelo menos um deles você possa confiar e que confiando não duvide de sua confiança.
E porque a vida é assim, desejo ainda que você tenha inimigos, nem muitos nem poucos, mas na medida exata para que algumas vezes você interprele a respeito de suas próprias certezas.
E que entre eles, haja pelo menos um que seja justo para que você não se sinta demasiadamente seguro.
Desejo depois que você seja útil, não insubstituívelmente útil mas razoavelmente útil.
E que nos maus momentos, quando não restar mais nada, essa utilidade seja suficiente para manter você de pé.
Desejo ainda que você seja tolerante, não com que os que erram pouco, porque isso é fácil, mas com aqueles que erram muito e irremediavelmente.
E que essa tolerância nem se transforme em aplauso nem em permissividade, para que assim fazendo um bom uso dela, você dê também um exemplo para os outros.
Desejo que você sendo jovem não amadureça depressa demais,
e que sendo maduro não insista em rejuvenescer,
e que sendo velho não se dedique a desesperar.
Porque cada idade tem o seu prazer e a sua dor e é preciso deixar que eles escorram dentro de nós.
Desejo por sinal que você seja triste, não o ano todo, nem um mês e muito menos uma semana,
mas um dia.
Mas que nesse dia de tristeza, você descubra que o riso diário é bom, o riso habitual é insosso e o riso constante é insano.
Desejo que você descubra com o máximo de urgência, acima e a despeito de tudo, talvez agora mesmo, mas se for impossível amanhã de manhã, que existem oprimidos, injustiçados e infelizes.
E que estão estão à sua volta, porque seu pai aceitou conviver com eles.
E que eles continuarão à volta de seus filhos, se você achar a convivência inevitável.
Desejo ainda que você afague um gato, que alimente um cão e ouça pelo menos um João-de-barro erguer triunfante seu canto matinal.
Porque assim você se sentirá bom por nada.
Desejo também que você plante uma semente por mais ridículo que seja e acompanhe seu crescimento dia a dia, para que você saiba de quantas muitas vidas é feita uma árvore.
Desejo, outrossim, que você tenha dinheiro porque é preciso ser prático. E que pelo menos uma vez por ano você ponha uma porção dele na sua frente e diga: Isto é meu.
Só para que fique claro quem é o dono de quem.
Desejo ainda que você seja frugal, não inteiramente frugal, não obcecadamente frugal, mas apenas usualmente frugal.
Mas que essa frugalidade não impeça você de abusar quando o abuso se impor*.
Desejo também que nenhum de seus afetos morra, por ele e por você. Mas que se morrer, você possa chorar sem se culpar e sofrer sem se lamentar.
Desejo por fim que,
sendo mulher, você tenha um bom homem
e que sendo homem tenha uma boa mulher.
E que se amem hoje, amanhã, depois, no dia seguinte, mais uma vez e novamente de agora até o próximo ano acabar.
E que quando estiverem exaustos e sorridentes, ainda tenham amor pra recomeçar.
E se isso só acontecer, não tenho mais nada para desejar

Sérgio Jockymann


Fonte: Folha da Tarde – Porto Alegre – 30 de Dezembro de 1978

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

People are strange


People are strange when you're a stranger
Faces look ugly when you're alone
Women seem wicked when you're unwanted
Streets are uneven when youre down
When you're strange
Faces come out of the rain
When you're strange
No one remembers your name

THE DOORS


Pessoas são estranhas

As pessoas são estranhas quando você é um estranho
Rostos ficam feios quando você está só
As mulheres parecem malvadas quando não lhe querem
As ruas são irregulares quando se está triste
Quando você é um estranho
Rostos se formam na chuva
Quando você é um estranho
Ninguém se lembra do seu nome

Ela é a fonte

Arthur Braginsky


Ela é a fonte. Eu posso saber que é
a grande fonte
em que todos pensaram. Quando no campo
se procurava o trevo, ou em silêncio
se esperava a noite,
ou se ouvia algures na paz da terra
o urdir do tempo ---
cada um pensava na fonte. Era um manar
secreto e pacífico.
Uma coisa milagrosa que acontecia
ocultamente.

Ninguém falava dela, porque
era imensa. Mas todos a sabiam
como a teta. Como o odre.
Algo sorria dentro de nós.

Minhas irmãs faziam-se mulheres
suavemente. Meu pai lia.
Sorria dentro de mim uma aceitação
do trevo, uma descoberta muito casta.
Era a fonte.

Eu amava-a dolorosa e tranquilamente.
A lua formava-se
com uma ponta subtil de ferocidade,
e a maçã tomava um princípio
de esplendor.

Hoje o sexo desenhou-se. O pensamento
perdeu-se e renasceu.
Hoje sei permanentemente que ela
é a fonte.

Herberto Hélder

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Sonhos de uma terça-feira gorda


Eu estava contigo. Os nossos dominós eram negros, e negras eram as nossas máscaras.
Íamos, por entre a turba, com solenidade,
Bem conscientes do nosso ar lúgubre
Tão constratado pelo sentimento felicidade
Que nos penetrava. Um lento, suave júbilo
Que nos penetrava… Que nos penetrava como uma espada de fogo…
Como a espada de fogo que apunhalava as santas extáticas.
E a impressão em meu sonho era que estávamos
Assim de negro, assim por fora inteiramente negro,
— Dentro de nós, ao contrário, era tudo claro e luminoso!

Era terça-feira gorda. A multidão inumerável
Burburinhava. Entre clangores de fanfarra
Passavam préstitos apoteóticos.
Eram alegorias ingênuas, ao gosto popular, em cores cruas.

Iam em cima, empoleiradas, mulheres de má vida,
De peitos enormes — Vênus para caixeiros.
Figuravam deusas — deusa disto, deusa daquilo, já tontas e seminuas.

A turba, ávida de promiscuidade,
Acotevelava-se com algazarra,
Aclamava-as com alarido.
E, aqui e ali, virgens atiravam-lhes flores.

Nós caminhávamos de mãos dadas, com solenidade,
O ar lúgubre, negro, negros…
mas dentro em nós era tudo claro e luminoso!
Nem a alegria estava ali, fora de nós.
A alegria estava em nós.
Era dentro de nós que estava a alegria,
— A profunda, a silenciosa alegria…


Manuel Bandeira

Tatuagem




Hei de deitar-me um dia no teu leito,
Hei de te olhar nos olhos, a sorrir,
Hei de dizer - sem medo e sem fingir -
De quantos sonhos meu amor é feito.

Tu me olharás, ardendo-te em desejo,
E atrairás meu corpo para o teu.
Hei de sentir-te finalmente meu,
Hás de sugar-me a alma com teu beijo.

Nós perderemos a noção do tempo,
Nós ouviremos o soprar do vento,
Que há de cantar o amor em prosa e verso.

Seremos força viva no presente,
Seremos água e sede eternamente,
Tatuados para sempre no universo


Sílvia Schmidt

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Entardeceres

william r davis

A clara profusão de um poente
enalteceu a rua,
a rua aberta como um vasto sonho
para qualquer acaso.
O límpido arvoredo
perde o último pássaro, o ouro último.
A mão andrajosa de um mendigo
agrava a tristeza dessa tarde.

O silêncio que mora nos espelhos
forçou seu cárcere.
A escuridão é o sangue
das coisas feridas.
No ocaso incerto
a tarde mutilada
foi umas pobres cores.


Jorge Luis Borges

Entre erótica e mística



As palavras,
Poesia, não só combato.
Durmo com elas.


Olga Savary

Vegans


Apaixonados por animais e pela natureza, os adeptos ao veganismo abrem mão de comer qualquer tipo de carne e alimentos de origem animal para defender seus ideais

Hambúrguer, gelatinas, chocolate ao leite e massas são apenas alguns dos pecados gastronômicos aos quais a gente quase nunca resiste. Agora imagine alguém que não consome nenhuma dessas delícias e só come verduras, frutas e alimentos de soja. Os vegans, ou veganistas, vivem assim e não tem nenhuma reclamação a fazer.

Diferente dos vegetarianos, os vegans não consomem nem vestem nada que tenha origem animal. Alimentos feitos à base de ovos, leite e mel são riscados do cardápio deles, assim como produtos testados em animais e roupas de couro, peles e penas são banidos de seus guarda-roupas.
Desde que vídeos como Terráqueos e o brasileiro A Carne é Fraca, que revelam todo o processo do abate de animais e peixes, foram divulgados na internet, os defensores dos Direitos dos Animais vêm ganhando cada vez mais simpatizantes. Entre os novos adeptos, existem muitos adolescentes que resolveram abraçar a causa e fazer do veganismo um estilo de vida.

Eles não consomem…
A lista do que os vegans não consomem é extensa. Ela inclui desde alimentos até vestimentas e remédios. Confira algumas das restrições dos adeptos ao veganismo:

• Qualquer tipo de carne
• Qualquer alimento que tenha ovo ou leite em sua composição
• Mel e todos os produtos oriundos de insetos
• Roupas de pele, lã, seda, camurça
• Acessórios feitos de pérolas, dentes, garras e plumas
• Travesseiros de pena
• Remédios alopáticos, que são testados em animais
• Vacinas e soros só devem ser usados em caso de vida ou morte
• Qualquer cosmético e produto testados em animais


Parabéns moçada!
Ah, se todos fossem iguais a vocês ...

domingo, 22 de fevereiro de 2009

A carícia perdida



La caricia perdida

Se me va de los dedos la caricia sin causa,
se me va de los dedos… En el viento, al pasar,
la caricia que vaga sin destino ni objeto,
la caricia perdida ¿quién la recogerá?

Pude amar esta noche con piedad infinita,
pude amar al primero que acertara a llegar.
Nadie llega. Están solos los floridos senderos.
La caricia perdida, rodará… rodará…

Si en los ojos te besan esta noche, viajero,
si estremece las ramas un dulce suspirar,
si te oprime los dedos una mano pequeña
que te toma y te deja, que te logra y se va.

Si no ves esa mano, ni esa boca que besa,
si es el aire quien teje la ilusión de besar,
oh, viajero, que tienes como el cielo los ojos,
en el viento fundida, ¿me reconocerás?

****

A carícia perdida

Sai-me dos dedos a carícia sem causa,
Sai-me dos dedos...
No vento, ao passar,
A carícia que vaga sem destino nem fim,
A carícia perdida, quem a recolherá?
Posso amar esta noite com piedade infinita,
Posso amar ao primeiro que conseguir chegar.
Ninguém chega. Estão sós os floridos caminhos.
A carícia perdida, andará... andará...
Se nos olhos te beijarem esta noite, viajante,
Se estremece os ramos um doce suspirar,
Se te aperta os dedos uma mão pequena
Que te toma e te deixa, que te engana e se vai.
Se não vês essa mão, nem essa boca que beija,
Se é o ar quem tece a ilusão de beijar,
Ah, viajante, que tens como o céu os olhos,
No vento fundida, me reconhecerás?


Alfonsina Storni




…Words, English words, are full of echoes, of memories, of associations. They have been out and about, on people's lips, in their houses, in the streets, in the fields, for so many centuries. And that is one of the chief difficulties in writing them today – that they are stored with other meanings, with other memories, and they have contracted so many famous marriages in the past. The splendid word "incarnadine," for example – who can use that without remembering "multitudinous seas"? In the old days, of course, when English was a new language, writers could invent new words and use them. Nowadays it is easy enough to invent new words – they spring to the lips whenever we see a new sight or feel a new sensation – but we cannot use them because the English language is old. You cannot use a brand new word in an old language because of the very obvious yet always mysterious fact that a word is not a single and separate entity, but part of other words. Indeed it is not a word until it is part of a sentence. Words belong to each other, although, of course, only a great poet knows that the word "incarnadine" belongs to "multitudinous seas." To combine new words with old words is fatal to the constitution of the sentence. In order to use new words properly you would have to invent a whole new language; and that, though no doubt we shall come to it, is not at the moment our business. Our business is to see what we can do with the old English language as it is. How can we combine the old words in new orders so that they survive, so that they create beauty, so that they tell the truth? That is the question.

And the person who could answer that question would deserve whatever crown of glory the world has to offer. Think what it would mean if you could teach, or if you could learn the art of writing. Why, every book, every newspaper you'd pick up, would tell the truth, or create beauty. But there is, it would appear, some obstacle in the way, some hindrance to the teaching of words. For though at this moment at least a hundred professors are lecturing on the literature of the past, at least a thousand critics are reviewing the literature of the present, and hundreds upon hundreds of young men and women are passing examinations in English literature with the utmost credit, still – do we write better, do we read better than we read and wrote four hundred years ago when we were un-lectured, un-criticized, untaught? Is our modern Georgian literature a patch on the Elizabethan? Well, where then are we to lay the blame? Not on our professors; not on our reviewers; not on our writers; but on words. It is words that are to blame. They are the wildest, freest, most irresponsible, most un-teachable of all things. Of course, you can catch them and sort them and place them in alphabetical order in dictionaries. But words do not live in dictionaries; they live in the mind. If you want proof of this, consider how often in moments of emotion when we most need words we find none. Yet there is the dictionary; there at our disposal are some half-a-million words all in alphabetical order. But can we use them? No, because words do not live in dictionaries, they live in the mind. Look once more at the dictionary. There beyond a doubt lie plays more splendid than Antony and Cleopatra; poems lovelier than the Ode to a Nightingale; novels beside which Pride and Prejudice or David Copperfield are the crude bunglings of amateurs. It is only a question of finding the right words and putting them in the right order. But we cannot do it because they do not live in dictionaries; they live in the mind. And how do they live in the mind? Variously and strangely, much as human beings live, ranging hither and thither, falling in love, and mating together. It is true that they are much less bound by ceremony and convention than we are. Royal words mate with commoners. English words marry French words, German words, Indian words, Negro words, if they have a fancy. Indeed, the less we enquire into the past of our dear Mother English the better it will be for that lady's reputation. For she has gone a-roving, a-roving fair maid.

Thus to lay down any laws for such irreclaimable vagabonds is worse than useless. A few trifling rules of grammar and spelling is all the constraint we can put on them. All we can say about them, as we peer at them over the edge of that deep, dark and only fitfully illuminated cavern in which they live – the mind – all we can say about them is that they seem to like people to think before they use them, and to feel before they use them, but to think and feel not about them, but about something different. They are highly sensitive, easily made self-conscious. They do not like to have their purity or their impurity discussed. If you start a Society for Pure English, they will show their resentment by starting another for impure English – hence the unnatural violence of much modern speech; it is a protest against the puritans. They are highly democratic, too; they believe that one word is as good as another; uneducated words are as good as educated words, uncultivated words as good as cultivated words, there are no ranks or titles in their society. Nor do they like being lifted out on the point of a pen and examined separately. They hang together, in sentences, paragraphs, sometimes for whole pages at a time. They hate being useful; they hate making money; they hate being lectured about in public. In short, they hate anything that stamps them with one meaning or confines them to one attitude, for it is their nature to change.

Perhaps that is their most striking peculiarity – their need of change. It is because the truth they try to catch is many-sided, and they convey it by being many-sided, flashing first this way, then that. Thus they mean one thing to one person, another thing to another person; they are unintelligible to one generation, plain as a pikestaff to the next. And it is because of this complexity, this power to mean different things to different people, that they survive. Perhaps then one reason why we have no great poet, novelist or critic writing today is that we refuse to allow words their liberty. We pin them down to one meaning, their useful meaning, the meaning which makes us catch the train, the meaning which makes us pass the examination…


sábado, 21 de fevereiro de 2009


“Encontrarás ainda adeptos da sabedoria que se negam que devas tirar a tua própria vida e consideram nefasto o suicídio; que deve-se esperar a saída prescrita pela natureza. Quem diz isso não vê que fecha o caminho da liberdade. A lei eterna não fez nada melhor do que quando nos deu uma única entrada para a vida, nos ter dado muitas para a saída.”

Sêneca

El inicio/ O início



Estás desnudo
y tu suavidad es inmensa
tiemblas en mis dedos
tu respiración vuela adentro de tu cuerpo

eres

como un pájaro en mis manos
vulnerable
como sólo el deseo podría hacerte vulnerable
ese dolor tan suave con el que nos tocamos
esa entrega en la que conocemos
el abandono de las víctimas

el placer como una fauce
nos lame nos devora
y nuestros ojos se apagan
se pierden.

***


Estás despido

e tua suavidade é imensa
tremes em minhas mãos

tua respiração voa dentro de meu corpo


és
como um pássaro em minhas mãos

vulnerável
como apenas o desejo poderia tornar-te vulnerável

essa dor tão suave com que nos tocamos

essa entrega em que nos conhecemos

o abandono das vítimas


o prazer como uma fauce
nos lambe nos devora
e nossos olhos se apagam
se perdem.


Veronica Volkow

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Elogio da loucura


Paul Albert Laurens

Não creio que as mulheres sejam tão loucas a ponto de se zangarem com o que digo aqui. Sou do sexo delas, sou a Loucura; provar que são loucas não é o maior elogio que se pode fazer delas? De fato, considerando bem as coisas, não é a essa Loucura que elas devem agradecer por serem infinitamente mais felizes que os homens? Não é dela que recebem aquelas graças, aqueles atrativos, que elas têm razão de preferir a tudo, e que lhes servem para acorrentar os mais orgulhosos tiranos?
De onde vêm, nos homens, essa aparência repulsiva e selvagem, essa pele áspera, essa floresta de barba e esse ar de velhice que eles têm em todas as idades? Tudo isso vem do maior de todos os vícios, a prudência. As mulheres, ao contrário, têm a face lisa, a voz suave, a pele delicada, contínua.

Erasmo de Roterdã, Elogio da loucura

Nelson Rodrigues - frases


- O jovem tem todos os defeitos do adulto e mais um: — o da imaturidade.

- Tudo passa, menos a adúltera. Nos botecos e nos velórios, na esquina e nas farmácias, há sempre alguém falando nas senhores que traem. O amor bem-sucedido não interessa a ninguém.

- Nós, da imprensa, somos uns criminosos do adjetivo. Com a mais eufórica das irresponsabilidades, chamamos de “ilustre”, de “insigne”, de “formidável”, qualquer borra-botas.

- A grande vaia é mil vezes mais forte, mais poderosa, mais nobre do que a grande apoteose. Os admiradores corrompem.

- O brasileiro não está preparado para ser “o maior do mundo” em coisa nenhuma. Ser “o maior do mundo” em qualquer coisa, mesmo em cuspe à distância, implica uma grave, pesada e sufocante responsabilidade.

- Há na aeromoça a nostalgia de quem vai morrer cedo. Reparem como vê as coisas com a doçura de um último olhar.

- Ou a mulher é fria ou morde. Sem dentada não há amor possível.

- O homem não nasceu para ser grande. Um mínimo de grandeza já o desumaniza. Por exemplo: — um ministro. Não é nada, dirão. Mas o fato de ser ministro já o empalha. É como se ele tivesse algodão por dentro, e não entranhas vivas.

- Assim como há uma rua Voluntários da Pátria, podia haver uma outra que se chamasse, inversamente, rua Traidores da Pátria.

- Está se deteriorando a bondade brasileira. De quinze em quinze minutos, aumenta o desgaste da nossa delicadeza.

- O boteco é ressoante como uma concha marinha. Todas as vozes brasileiras passam por ele.

- A mais tola das virtudes é a idade. Que significa ter quinze, dezessete, dezoito ou vinte anos? Há pulhas, há imbecis, há santos, há gênios de todas as idades.

- Outro dia ouvi um pai dizer, radiante: — “Eu vi pílulas anticoncepcionais na bolsa da minha filha de doze anos!”. Estava satisfeito, com o olho rútilo. Veja você que paspalhão!

- Em nosso século, o “grande homem” pode ser, ao mesmo tempo, uma boa besta.

- O artista tem que ser gênio para alguns e imbecil para outros. Se puder ser imbecil para todos, melhor ainda.

- Toda mulher bonita leva em si, como uma lesão da alma, o ressentimento. É uma ressentida contra si mesma.

- Acho a velocidade um prazer de cretinos. Ainda conservo o deleite dos bondes que não chegam nunca.

- Chegou às redações a notícia da minha morte. E os bons colegas trataram de fazer a notícia. Se é verdade o que de mim disseram os necrológios, com a generosa abundância de todos os necrológios, sou de fato um bom sujeito.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

No mar




Les étoiles s’allument au ciel, et la brise du soir erre doucement parmi les fleurs: rêvez, chantez et soupirez.

GEORGE SAND

Era de noite: — dormias,
Do sonho nas melodias,
Ao fresco da viração,
Embalada na falua,
Ao frio clarão da lua,
Aos ais do meu coração!

Ah! que véu de palidez
Da langue face na tez!
Como teus seios revoltos
Te palpitavam sonhando!
Como eu cismava beijando
Teus negros cabelos soltos!

Sonhavas? — eu não dormia;
A minh’alma se embebia
Em tua alma pensativa!
E tremias, bela amante,
A meus beijos, semelhante
Às folhas da sensitivas!

E que noite! que luar!
E que ardentias no mar!
E que perfumes no vento!
Que vida que se bebia
Na noite que parecia
Suspirar de sentimento!

Minha rola, ó minha flor,
Ó madressilva de amor,
Como eras saudosa então!
Como pálida sorrias
E no meu peito dormias
Aos ais do meu coração!

E que noite! que luar!
Como a brisa a soluçar
Se desmaiava de amor!
Como toda evaporava
Perfumes que respirava
Nas laranjeiras em flor!

Suspiravas? que suspiro!
Ai que ainda me deliro
Entrevendo a imagem tua
Ao fresco da viração,
Aos ais do meu coração,
Embalada na falua!

Como virgem que desmaia,
Dormia a onda na praia!
Tua alma de sonhos cheia
Era tão pura, dormente,
Como a vaga transparente
Sobre seu leito de areia!

Era de noite — dormias,
Do sonho nas melodias,
Ao fresco da viração;
Embalada na falua,
Ao frio clarão da lua,
Aos ais do meu coração.

Álvares de Azevedo, 
Lira dos Vinte Anos - publicado postumamente em 1853. 

Abraçar um bebê do ponto de vista de um cão

1. Primeiro.., uuhmm, encontrar um bebê!!!.... aí está um.



2. Depois, assegura-te de que o que encontraste é realmente um bebê...eu usaria a clássica técnica do olfato que, normalmente, funciona bastante bem.



3. Antes do abraço propriamente dito, talvez necessites de imobilizar um pouco o objeto para que não se mova e estrague o plano. A cabeça, se fores grande, é uma boa opção.



4. Se houver uma câmara vídeo perto, vai colocando as patas ao redor do objeto e prepara-te para um possivel primeiro plano.



5. Por último, se finalmente há uma câmara e queres que a tua foto seja perfeita, terás que executar uma difícil pose que aos donos do objeto encantará.

Secretamente


Seus olhos estão perigosamente dentro
de mim
aqui fizeram morada
e estão como Deus
em toda parte
se interpondo
entre a paisagem mais próxima
entre a fresta de luz e a imagem
tangenciando meu olhar
que não sabe olhar puro
que se trai a cada segundo.

Seus olhos estão perigosamente pousados
sobre mim
como borboleta em flor
cobrindo minha pele em ternura
suaves como seda
a farfalhar sobre os poros
e os pelos.
Luzes que incendeiam
em sublime música
meu corpo aceso em sede
Sombras sobre minha noite
embalam meu sono
devassando meus sonhos
onde secretamente me assombram
estando fora e sendo dentro
espelhos de amor intenso
e imenso.
Nossos olhos estão perigosamente
em comunhão
a despeito da separação
que a vida nos impõe.
E nossas vidas
sob risco
entre sermos felizes
ou tristes
e nossos destinos
por um triz
entre sucessos
e desatinos.
Secretamente
espreitamos-nos
como caminhos
à beira
de atraentes abismos.


Virgínia Schall

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

 Fabian Perez.

É exatamente o que me contava, há muito tempo, aliás, um médico — observou o stariéts. — Era um homem de idade madura e verdadeiramente inteligente, exprimia-se tão francamente como a senhora, se bem que brincando, mas com tristeza. “Eu amo — dizia ele — a humanidade, mas admiro-me de mim mesmo. Tanto mais amo a humanidade em geral, quanto menos amo as pessoas em particular, como indivíduos. Muitas vezes tenho sonhado apaixonadamente em servir à humanidade, e talvez tivesse verdadeiramente subido ao calvário por meus semelhantes, se tivesse sido preciso, muito embora não possa viver com ninguém dois dias no mesmo quarto. Sei-o por experiência. Desde que alguém está junto de mim, sua personalidade oprime meu amor-próprio e constrange minha liberdade. Em vinte e quatro horas, posso mesmo antipatizar com as melhores pessoas: uma, porque fica muito tempo na mesa, outra, porque está resfriada e só faz respirar. Torno-me o inimigo dos homens, apenas se acham eles em contato comigo! Em compensação, quanto mais detesto as pessoas em particular, tanto mais ardo de amor pela humanidade em geral.

Fiódor Dostoiévski, in Os Irmãos Karamazov

Triste




Há uma profunda tristeza em meus cantos,
ultimamente e eu gostaria de saber dizer.
Há um enorme vazio em meus olhos,
como se a luz inesperadamente apagasse
ou como se o tempo subitamente parasse
e não soubesse, assim tão de repente, o que fazer.
Há um certo frio nos ossos e no coração,
como se a pele que os ocultasse, acinzentasse,
num feitio desesperançado e mórbido, nem choro
nem gozo em dias que se arrastam intermináveis.
Há um grito que não explode na garganta,
não há passos me entregando a algum lugar.
Há, sobretudo, insensibilidade, a falta absoluta
de algum sentido, uma absurda nulidade de haver,
numa sobra de tempo que acovarda.


Gisele Temper

Desculpa - Ana Carolina



Te olho nos olhos e você reclama
que te olho muito profundamente.
Desculpa, tudo que vivi foi profundamente.
Eu te ensinei quem sou, e você foi me tirando os espaços entre os abraços,
guarda-me apenas uma fresta.

Eu que sempre fui livre, não importava o que os outros dissessem.
Até onde posso ir para te resgatar?

Reclama de mim, como se houvesse a possibilidade
De eu me inventar de novo.

Desculpa, se te olho profundamente, rente à pele
a ponto de ver seus ancestrais nos seus traços,
a ponto de ver a estrada muito antes dos teus passos.

Eu não vou separar as minhas vitórias dos meus fracassos!
Eu não vou renunciar a mim; nenhuma parte, nenhum pedaço
do meu ser vibrante, errante, sujo, livre, quente.

Eu quero estar viva e permanecer te olhando profundamente!


(DESCULPA - Texto Ana Carolina - Adaptação unindo trechos das obras do poeta gaúcho Fabrício Carpinejar e do poeta russo Boris Pasternak)

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

When You are old


When you are old and gray and full of sleep
And nodding by the fire, take down this book,
And slowly read, and dream of the soft look
Your eyes had once, and of their shadows deep;

How many loved your moments of glad grace,
And loved your beauty with love false or true;
But one man loved the pilgrim soul in you,
And loved the sorrows of your changing face.

And bending down beside the glowing bars,
Murmur, a little sadly, how love fled
And paced upon the mountains overhead,
And hid his face amid a crowd of stars.

William Butler Yeats. b. 1865

Quando fores velha

Quando já fores velha, e grisalha, e com sono,
Pega este livro: junto ao fogo, a cabecear,
Lê com calma; e com os olhos de profundas sombras
Sonha, sonha com o teu antigo e suave olhar.

Muitos amaram-te horas de alegria e graça,
com amor sincero ou falso amaram-te a beleza;
Só um, amando-te a alma peregrina em ti,
De teu rosto a mudar amou cada tristeza.

E curvando-te junto à grade incandescente,
Murmura com amargura como o amor fugiu
E caminhou montanha acima, a subir sempre,
E o rosto em multidão de estrelas encobriu.

William B. Yeats
(tradução de Péricles Eugênio da Silva Ramos)

sábado, 14 de fevereiro de 2009

Poemacto II


Minha cabeça estremece com todo o esquecimento. Eu procuro dizer como tudo é outra coisa. Falo, penso. Sonho sobre os fortes ossos dos pés. É sempre outra coisa, uma só coisa coberta de nomes. E a morte passa de boca em boca com a leve saliva, com o terror que há sempre no fundo informulado de uma vida. Sei que os campos imaginam as suas próprias rosas. As pessoas imaginam seus próprios campos de rosas. E às vezes estou na frente dos campos como se morresse; outras, como se agora somente eu pudessse acordar. Por vezes tudo se ilumina. Por vezes sangra e canta. Eu digo que ninguém se perdoa no tempo. Que a loucura tem espinhos como uma garganta. Eu digo: roda ao longe o outono, e o que é o outono? As pálpebras batem contra o grande dia masculino do pensamento. Deito coisas vivas e mortas no espírito da obra. Minha vida extasia-se como uma câmara de tochas. - Era uma casa - como direi? - absoluta. Eu jogo, eu juro. Era uma casinfância. Sei como era uma casa louca. Eu metia as mãos na água: adormecia, relembrava. Os espelhos rachavam-se contra a nossa mocidade. Apalpo agora o girar das brutais, líricas rodas da vida. Há no meu esquecimento,ou na lembrança total das coisas, uma rosa como uma alta cabeça, um peixe como um movimento rápido e severo. Uma rosapeixe dentro da minha ideia desvairada. Há copos, garfos inebriados dentro de mim. - Porque o amor das coisas no seu tempo futuro é terrivelmente profundo, é suave, devastador. As cadeiras ardiam nos lugares. Minhas irmãs habitavam ao cimo do movimento como seres pasmados. Às vezes riam alto.Teciam-se em seu escuro terrífico. A menstruação sonhava podre dentro delas, à boca da noite. Cantava muito baixo. Parecia fluir. Rodear as mesas, as penumbras fulminadas. Chovia nas noites terrestres. Eu quero gritar paralém da loucura terrestre. - Era húmido, destilado, inspirado. Havia rigor. Oh, exemplo extremo. Havia uma essência de oficina. Uma matéria sensacional no segredo das fruteiras, com sua maçãs centrípetas e as uvas pendidas sobre a maturidade. Havia a magnólia quente de um gato. Gato que entrava pelas mãos, ou magnólia que saía da mão para o rosto da mãe sombriamente pura. Ah! mãe louca à volta, sentadamente completa. As mãos tocavam por cima do ardor a carne como um pedaço extasiado. Era uma casabsoluta- como direi? - um sentimento onde algumas pessoas morreriam. Demência para sorrir elevadamente. Ter amoras, folhas verdes, espinhos com pequena treva por todos os cantos. Nome no espírito como uma rosapeixe. - Prefiro enlouquecer nos corredores arqueados agora na palavras. Prefiro cantar nas varandas interiores. Porque havia escadas e mulheres que paravam minadas de inteligência. O corpo sem rosáceas, a linguagem para amar e ruminar. O leite cantante. Eu agora mergulho e ascendo como um copo. Trago para cima essa imagem de àgua interna. - Caneta do poema dissolvida no sentido primacial do poema. Ou o poema subindo pela caneta, atravessando seu próprio impulso, poema regressando. Tudo se levanta como um cravo, uma faca levantada. Tudo morre o seu nome noutro nome. Poema não saindo do poder da loucura. Poema com base inconcreta de criação. Ah, pensar com delicadeza, imaginar com ferocidade. Porque eu sou uma vida com furibunda melancolia, com furibunda concepção. Com alguma ironia furibunda. Sou uma devastação inteligente. Com malmequeres fabulosos. Ouro por cima. A madrugada ou a noite triste tocadas em trompete. Sou alguma coisa audível, sensível. Um movimento. Cadeira congeminando-se na bacia, feita o sentar-se. Ou flores bebendo a jarra. O silêncio estrutural das flores. E a mesa por baixo. A sonhar.


Herberto Hélder

O jogo de cartas



De modo bastante peculiar, a necessidade de excitar a vontade revela-se na invenção e na preservação do jogo de cartas, que constitui a expressão mais autêntica do lado lastimável da humanidade.

Em todos os países, a principal ocupação da sociedade tornou-se o jogo de cartas: este é a medida do valor dessa sociedade e a falência declarada de todos os pensamentos. Uma vez que tais pessoas não têm pensamentos para trocar, trocam cartas e buscam tirar florins umas das outras. Ó estirpe miserável!

O jogo de cartas exerce uma influência desmoralizadora. O espírito do jogo consiste, de fato, em usar de todos os métodos, golpes e truques para tirar do parceiro o seu dinheiro. Entretanto, o hábito de proceder de tal forma no jogo enraíza-se, estende-se para a vida prática, de modo que, pouco a pouco, o indivíduo passa a aplicar os mesmos princípios para decidir o que é dele e o que é do outro, e a considerar lícito desfrutar de qualquer vantagem que se tenha em mãos, contanto que seja legalmente permitido.

Arthur Schopenhauer in A Arte de Insultar.

Vegetarianismo e Paz



“Chegará o dia em que a tristeza
que se vê nos olhos dos animais se instalará em
definitivo no olhar dos animais humanos.
A natureza, cedo ou tarde, sempre faz a cobrança.”
Sílvia Schmidt


VEGETARIANISMO E PAZ
Autor: Ivana Maria França de Negri


Num futuro não muito distante, os habitantes deste planeta terão que optar entre continuar a se alimentar da carne dos animais ou aceitar a própria extinção da espécie humana.

Com a explosão populacional crescente, não haverá espaço físico para criar tanto gado destinado a alimentar esse contingente de novas pessoas dentro da extensão limitada da terra. O rebanho de milhões de cabeças de gado nunca será suficiente para sustentar tantas bocas, e nem as plantações de grãos serão bastantes para nutrir o imenso rebanho. A água, que se tornará artigo de luxo, não poderá servir aos humanos e à criação de gado ao mesmo tempo. Os grãos deverão se destinar aos milhares de novos humanos, ou eles serão fadados a morrer de fome.

Os animais, pequenos “cristos” imolados todos os dias para saciar a voracidade humana, cujos corpos judiados, sanguinolentos e esquartejados são expostos nos açougues e supermercados para a venda, são cada vez mais explorados para atender a demanda de criação, engorda rápida, abate e consumo. Tal alimento só pode fazer mal ao espírito, pois é produto de violência e gera intenso suplício ao animal desde o nascimento até quando sobe a rampa do matadouro.

Jamais compreendi o amor que algumas pessoas têm por seus cães e gatos, tratando-os como filhos, sendo que essas mesmas pessoas, adoradoras de cães e gatos, comem a carne de vacas, porcos, coelhos, carneiros, galinhas, peixes e outros animais, incentivando a indústria mais cruel que existe, a da carne. Qual a diferença? Por que amar alguns e devorar outros? Essa é uma incoerência que nunca entendI.

Chegará o dia em que comer a carne de um animal será um sacrilégio, assim como hoje é crime o canibalismo. Matar um animal será como assassinar um ser da própria espécie para devorar sua carne.

A indústria voraz e sedenta por lucro não se importa nem um pouco com o sofrimento das criaturas. Drogas são injetadas em aves para crescimento e engorda rápida. São cortados seus bicos para não ciscarem e não se ferirem no diminuto espaço que dispõem nos poucos dias de vida. Bois são castrados e marcados com ferro incandescente sem anestesia e se contorcem de dor. Patos são forçados a comer através de um funil acoplado em suas gargantas, dia e noite, até que seus fígados fiquem doentes de tanta gordura, para a fabricação do patê “foie gras”. Bezerros são apartados de suas mães e colocados num engradado no qual não podem se mover para que não criem músculos e a carne permaneça rósea e macia. Vão para o abate literalmente carregados devido ao alto grau de anemia. Países mais civilizados que o nosso já aboliram a vitela (baby beef) e o “foie gras” devido ao alto grau de tortura a que são submetidos os animais.

A humanidade clama por paz, mas não deixa os outros seres da criação viverem em paz. E por isso não consegue alcançá-la. Enquanto não despertar sua consciência e continuar em sua cegueira mental, o homem não alcançará a almejada paz.

Sea Shepherd Conservation Society

Você sabia que neste momento existem pessoas em alto mar dedicando suas vidas à preservação das espécies marinhas? Elas enfrentam hostilidade, tempestades, saudade e todo tipo de dificuldade para fazer o que a maioria de nós não tem coragem e/ou condições para fazer.



A Sea Shepherd Conservation Society - SSCS foi fundada em 1977, nos Estados Unidos, pelos fundadores do Greenpeace, que, ao engajarem-se nesse novo projeto, criaram um movimento de caráter mais ágil, objetivo e ativista. Atualmente, a Sea Shepherd é considerada a ONG de proteção dos mares mais ativista do mundo e conta com a participação efetiva de milhares de voluntários em todo o planeta.



O capitão Paul Watson está à frente de ações realmente ousadas e perigosas. Luta incansavelmente pela vida marinha com recursos de batalha: ele literalmente joga seu navio em navios “caçadores” a fim de impedi-los de matar mais e mais animais marinhos.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Adiamento


Depois de amanhã, sim, só depois de amanhã…
Levarei amanhã a pensar em depois de amanhã,
E assim será possível; mas hoje não…
Não, hoje nada: hoje não posso,
A persistência confusa da minha subjetividade objetiva,
O sono da minha vida real, intercalado,
O cansaço antecipado e infinito,
Um cansaço de mundos para apanhar um elétrico …
Este espécie de alma…
Só depois de amanhã…
Hoje quero preparar-me,
Quero preparar-me para pensar no dia seguinte …
Ele é que é decisivo.
Tenho já o plano traçado; mas não, hoje não traço planos…
Amanhã é o dia dos planos.
Amanhã sentar-me-ei à secretária para conquistar o mundo;
Mas só conquistarei o mundo depois de amanhã…
Tenho vontade de chorar,
Tenho vontade de chorar muito de repente, de dentro…

Não, não queiram saber mais nada, é segredo, não digo.
Só depois de amanhã…
Quando era criança o circo de domingo divertia-se toda a semana.

Hoje só me diverte o circo de domingo de toda a semana da
minha infância…
Depois de amanhã serei outro,
A minha vida triunfar-se-á,
Todas a minhas qualidades reais de inteligente, lido e prático
Serão convocadas por um edital…
Mas por um edital de amanhã…
Hoje quero dormir, redigirei amanhã…
Por hoje, qual é o espetáculo que me repetiria a infância?
Mesmo para eu comprar os bilhetes amanhã,
Que depois de amanhã é que está bem o espetáculo…
Antes, não…
Depois de amanhã terei a pose pública que amanhã estudarei,
Depois de amanhã serei finalmente o que hoje não posso
nunca ser.
Só depois de amanhã…
Tenho sono como o frio de um cão vadio,
Tenho muito sono.
Amanhã te direi as palavras, ou depois de amanhã…
Sim talvez só depois de amanhã…

O porvir…
Sim, o porvir….



Fernando Pessoa

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Amizade Estelar


Éramos amigos e agora somos estranhos um ao outro. Mas não importa que assim o seja: não procuremos escondê-lo ou calá-lo como se isso nos desse razão para nos envergonhar. Somos dois navios cada um dos quais com o seu objetivo e a sua rota particular; podemos cruzar-nos,talvez, e celebrar juntos uma festa, como já o fizemos - e esses corajosos barcos estavam lá tão tranquilos, debaixo do mesmo sol, no mesmo porto, que se teria acreditado que tinham alcançado o objetivo, o mesmo destino. Mas a onipotência das nosss tarefas separou-nos em seguida, empurrados para mares diferentes, debaixo de outros sóis - e talvez nunca mais nos voltemos a ver: mares diferentes, sóis diferentes nos mudaram! Era preciso que nos tornássemos estranhos um ao outro: era a lei que pesava entre nós; é exatamente por isso que nos devemos mais respeito. Para que a idéia da nossa antiga amizade torne-se mais sagrada! Há provavelmente uma formidável trajetória, uma pista invisível, uma órbita estelar, sobre a qual os nossos caminhos e os nossos objetivos diferentes estão inscritos como pequenas etapas; elevemo-nos até este pensamento. Porém, a nossa vida é demasiado curta e a nossa vista demasiado fraca para que possamos ser mais que amigos, no sentido em que permite esta sublime possibilidade ... Acreditemos, então, na nossa amizade estelar, mesmo se tivermos de ser inimigos na terra.

Friedrich Nietzsche

Um Louco Desesperado


Ah! O que escrevi na mesa e na parede,
Com meu coração de louco - com minha
Mão de louco
Não deveria decorar para mim mesa e parede? ...

Mas dizeis: "As mãos de louco emporcalham;
E é necessário purificar mesa e parede
De todos os riscos, até que o menor desapareça".

Dai-me licença! Vou ajudá-los.
Aprendi a trabalhar com a esponja e a vassoura
Como crítico, como varredor.

Mas assim que o trabalho estiver acabado,
Gostarei muito de vos ver, a vós supersábios,
Cobrindo mesa e parede com vossa sabedoria de m ..."



Friedrich Nietzsche

...Aqui estais, finalmente, meus amigos!
Ai! não é a mim que procurais?
Hesitais, mostrais surpresa?
Insultai-me é melhor! Eu não sou mais eu?
Mudei de mão, de rosto, de andar?
O que eu era, amigos, acaso não mais sou?

Tornei-me, talvez, outro?
Estranho a mim mesmo? De mim mesmo, fugido?
Lutador que muitas vezes venceu a si mesmo?
Que muitas vezes lutou contra a própria força,
ferido, paralisado pelas vitórias contra si mesmo?

Porventura não procurei os mais ásperos ventos
e aprendi a viver onde ninguém habita,
nos desertos onde impera o urso polar?
Não esqueci a Deus e ao homem, blasfêmias e orações?
Tornei-me um fantasma das geleiras.

Oh! meus velhos amigos, vossos rostos
empalidecem de imediato,
transtornados de ternura e espanto!
Andai, sem rancor! Não podeis demorar aqui!
Não é para vós este país de geleiras e rochas!
Aqui é preciso ser caçador e antílope!


Friedrich Nietzsche

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009



Tenho medo de perder a maravilha
de teus olhos de estátua, e o acento
que de noite me põe em plena face
a solitária rosa de teu alento.
Tenho pena de ser nesta imagem
tronco sem ramos; e o que mais sinto
é não ter a flor, polpa ou argila,
para o verme de meu sofrimento.
Se tu és o meu tesouro oculto,
se és a minha cruz e minha dor molhada,
se sou o cão do teu senhorio,
não me deixes perder o que ganhei
e decora as águas do teu rio
com folhas do meu Outono alienado

Federico Garcia Lorca


Just love it!