sexta-feira, 23 de setembro de 2022

 

Aaron Griffin


As mulheres loucas arrumam os quartos, fazem

as camas desfeitas, empilham camisas e calças,

abotoam os cintos do infinito, prendem os laços

da sombra. Com os seus olhos cegos, enfiam

agulhas no buraco da vida, cosem as feridas

do amor que não tiveram, cantam devagar

a canção da idade fria. Dispo essas mulheres

no meu poema; espalho as suas roupas pelas cadeiras

do quarto; abro a cama onde as deito; rasgo

os pontos que acabaram de coser. O seu sexo -

seco pelos ventos de uma inquietação nocturna

- humedece-me os dedos. Desfolho os dias de março

enquanto desfloro os seus lábios. Por vezes,

as mulheres loucas abrem a porta da varanda,

respiram o perfume das trepadeiras brancas

da primavera, desmaiam com o sol.


Nuno Júdice